Arte urbana no Porto: os olhares e os retratos de Rebeb

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Arte urbana no Porto: os olhares e os retratos de Rebeb

Para quem habita a cidade do Porto, ou até para quem a visita, é fácil cruzar-se com a chamada arte urbana, em inúmeras fachadas de edifícios.

[Texto de Ruben Marques]

O que é certo é que, na contemporaneidade, esta designação de arte abrange diversas vertentes. Uma delas é a “bombing” – geralmente manifestações ilegais à base de letras, que têm como propósito espalhar o nome e a mensagem ao extremo – e outra é a “street art” – considerada, do mesmo modo, ilegal, mas com a finalidade de transmitir uma mensagem ou, simplesmente, embelezar o sítio onde está representada. Ora, o facto de existir, somente, uma denominação para diferentes formas artísticas, acaba por dificultar a distinção entre vandalismo e arte, acabando por, muitas vezes, ser tudo visto como a mesma coisa.

A 23 de agosto de 2013, em Portugal, foi decretada a Lei nº 61/2013 que estabeleceu como crime “grafitos, afixações, picotagem e outras formas de alteração, ainda que temporária, das caraterísticas originais de superfícies exteriores de edifícios, pavimentos, passeios, muros e outras infraestruturas, nomeadamente rodoviárias e ferroviárias, vedações, mobiliário e equipamento urbanos, bem como de superfícies interiores e ou exteriores de material circulante de passageiros ou de mercadorias, quando tais alterações não sejam autorizadas pelos respetivos proprietários e licenciadas pelas entidades competentes conforme nela definido.” Quem desrespeitar a lei arrisca ser punido com coimas, que podem ir de 100€ a 25.000€.

Segundo o artigo 3.º da mesma lei, “compete às câmaras municipais licenciar a inscrição de grafitos, a picotagem ou a afixação, em locais previamente identificados pelo requerente, mediante a apresentação de um projeto e da autorização expressa e documentada do proprietário da superfície ou do seu representante legal, quando este exista.” Mediante o ponto três deste artigo, “não são suscetíveis de licenciamento as intervenções que descaracterizem, alterem, conspurquem ou manchem a aparência exterior e ou interior de monumentos, edifícios públicos, religiosos, de interesse público e de valor histórico ou artístico ou de sinalização destinada à informação legal, à segurança, à higiene, ao conforto, à regulação da disciplina da circulação de veículos e pessoas, e à exploração adequada dos meios de transporte público, ou que com estas contendam.” Aquando da saída desta lei, o descontentamento foi geral, tanto para artistas como para apreciadores de arte urbana.

Contudo, no ano posterior, o surgimento do programa municipal de arte urbana veio trazer uma nova esperança e um certo alento aos adeptos deste tipo de arte, que durante anos se viram condicionados pelas brigadas anti-graffiti camarárias. A partir desta altura, mediante as iniciativas do município, foram disponibilizadas várias paredes legais, que tinham como objetivo a atuação dos artistas no espaço público. Ainda assim, estas atividades autorizadas não são suficientes e há quem continue a pintar em paredes de edifícios degradados e/ou abandonados ou então em fachadas habitacionais, com a autorização dos proprietários. Por aqui é entendida a importância desta expressão artística, tanto para artistas, que sentem a liberdade de se manifestarem através do que pintam, como para as cidades que ganham mais cor e, para alguns, beleza, também.

Valentin Robert ou Rebeb, como é conhecido, dedica-se à arte desde 2012 e é um dos criadores que mais cor dá à cidade do Porto e a tantos outros locais espalhados pelo mundo. Nascido em Coutières, uma aldeia em Deux-Sévriens, na França, já fez pinturas por todo o país que o viu nascer. Mas também em Nápoles, na aldeia de Garcibuey, em Espanha, na Noruega, em Lisboa e no Porto, uma cidade que muito preza e que faz questão de visitar todos os anos. O artista afirma que sempre que pintou no Porto fê-lo a meio do dia, sem autorização, o que fazia com que tentasse fazê-lo rápido o suficiente “para evitar uma prisão.”

Rebeb afirma que desenha desde a infância, mas as técnicas tradicionais que aprendia nas aulas de desenho não combinavam com o perfil que idealizava. Recorda que começou a pintar nas paredes da casa da família e que os primeiros trabalhos foram “retratos em estêncil, tinta spray e marcador”, tendo sido, posteriormente, vendidos ao Petit`Boutik, em Vasles. “Comecei a interessar-me pela arte de rua e pela pintura aos 22 anos. Eu via graffiti por MTO e FLOW e eu disse a mim mesmo: “é maravilhoso ver retratos tão grandes e realistas, eu também gostaria de os fazer, então comecei a pintar coisas simples em telas, depois em paredes e com muito trabalho e determinação, progredi.” Graças a isto, desde 2017, o artista dedica o tempo inteiramente à arte.

Costuma usar o poder do preto e branco, mas também gosta de adicionar outras cores às pinturas, tanto para poder integrá-las no espaço onde são representadas, como para lhes dar um certo contraste. Quando pinta nestes ambientes citadinos, na maioria das vezes, opta por escolher paredes já marcadas ou danificadas.

Hoje em dia, nas criações desenvolvidas no exterior, foca-se, essencialmente, no realismo e no figurativo, transpondo, para a tela ou para as fachadas, as fortes emoções das fotografias que lhe despertam a atenção.

“O que eu gosto é, principalmente, fazer retratos realistas e libertar força através da posição do corpo ou do olhar, por exemplo”

Rebeb

É, precisamente, a predominância de rostos ou, simplesmente, de olhares, da autoria de Rebeb, que podem ser encontrados na cidade do Porto.

Uma das imagens foi esboçada na Rua da Madeira, que liga a Praça da Batalha à Estação Ferroviária de São Bento. “Fiz a pintura no cimo das escadas com a Isaure, uma amiga minha que também é artista. Ela tratou do fundo em estilo vitral colorido e eu fiz este retrato que me inspira a acreditar, um lado celestial pela postura dela.”

Não muito longe da imagem anterior, na Rua do Cativo, é possível encontrar outra pintura, igualmente da autoria do artista. Confessa que, neste caso, “foi claramente a parede que me atraiu, estava muito “emoldurada”. Escolhi focar no poder do olhar.” Conta que “os donos do prédio chegaram à tarde e mandaram-me parar ou chamariam a polícia. Então eu saí e voltei para terminar, rapidamente, à noite.”

Um dos projetos mais marcantes para o artista, “o mais lindo, o mais forte”, remete a julho de 2021 e encontra-se perto da estação da cidade de Poitiers, na França. É o olhar de Tiphaine Véron, uma cidadã francesa que desapareceu em 2018, no Japão, e não mais foi encontrada. O objetivo da obra foi prestar uma homenagem e assinalar a data do desaparecimento desta mulher, muito perto do sítio onde morava.

“Gosto de pintar na rua porque as pinturas serão visíveis para todos e também para aqueles que não ousam cruzar a porta de uma galeria de arte ou de um museu. O que me interessa nesta prática é que todos possam beneficiar dela. Depois são livres de gostar ou não gostar.” Para além de se sentir fascinado a pintar em espaços exteriores, trabalha em tela, aerossol e acrílico.

Rebeb não esconde os desejos de fazer uma exposição e de pintar uma grande fachada no Porto.

Ruben Marques

Chamo-me Ruben Marques, tenho 20 anos e sou de Gondomar. Decidi seguir o curso de Ciências da Comunicação, uma vez que, foi a área que sempre me fascinou e é o que me vejo a fazer no futuro.