Covid-19 provoca efeito duplo no Programa Erasmus

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Covid-19 provoca efeito duplo no Programa Erasmus

A pandemia originada pelo novo coronavírus fez cair, na generalidade, o número de estudantes em Erasmus. Ainda assim, há exceções. 

[Texto de Ruben Marques]

Segundo a Comissão Europeia, a pandemia de Covid-19 teve um grande impacto nas viagens internacionais, em virtude das restrições que foram sendo impostas. A nível europeu, como consequência do novo coronavírus, 77% das instituições do ensino superior cancelaram algumas das mobilidades do programa Erasmus, 30% procederam ao cancelamento de todas as mobilidades programadas e 47%, somente, com alguns países. Posto isto, a mobilidade de estudantes entre países, no ensino superior, enfrentou efeitos “drásticos e imediatos” que podem ter um impacto a médio e longo prazo.

A Universidade do Porto, que desde 2014 a 2019 foi a instituição portuguesa que mais estudantes enviou de Erasmus, em 2020 recuou para segundo lugar. Depois de seis anos consecutivos acima dos mil alunos a aderirem a este programa, em 2020 a fasquia baixou até aos 731, o que permitiu a cedência da liderança do ranking à Universidade de Lisboa.

Apesar das estatísticas apontarem para uma redução do número de estudantes em Erasmus, no ano de 2020, Janet Dias, responsável pelo Serviço de Relações Internacionais, da Universidade Lusófona do Porto (ULP), afirma que em 2020-2021 este número até aumentou face aos anos anteriores. Em média, a instituição enviava 15 a 20 estudantes por ano. Em 2019-2020 o número rondou a média dos anos transatos, ao registar a adesão de 17 estudantes. Já em 2020-2021, em pleno período pandémico, foram 27 os alunos que decidiram aventurar-se “fora de portas”. 

Depois de um primeiro semestre com poucos estudantes a saírem em Erasmus, devido ao elevado número de infetados obrigar a uma maior contenção, a melhoria deste mesmo número e a chegada das vacinas, permitiu um aumento da mobilidade no semestre posterior, refere Janet Dias. As principais razões que aponta para este acréscimo centram-se no facto de, “apesar de tudo, a mobilidade continuou a ser possível” e “também se deve ao trabalho de disseminação de informação por parte deste serviço.” Assim, considera que nenhum dos dois anos letivos anteriores foi afetado pela pandemia de forma significativa. 

Ao contrário do que aconteceu no outgoing, na modalidade de receção de estudantes oriundos de universidades estrangeiras (incoming), por parte da Universidade Lusófona do Porto, a tendência de subida inverteu-se. “Essa sim foi bastante afetada, costumávamos receber todos os anos à volta de 60 estudantes e no ano letivo passado, apenas recebemos 35.”

Com o primeiro semestre quase concluído, o processo do programa de mobilidade, na ULP, decorre “normalmente” e conta já com 14 inscrições que, segundo a responsável, “aumentarão até ao final do ano”. Questionada sobre possíveis desistências, devido à Covid-19, por parte de estudantes que irão de Erasmus no segundo semestre, a responsável afirmou que tal não se constata.

Janet acredita que alguns estudantes colocaram de parte a hipótese de fazer Erasmus, à conta da pandemia de Covid-19. Porém, “os números mostram que apesar do cenário pandémico, conseguimos aumentar o número de estudantes outgoing.” 

Um desejo não concretizado por culpa da pandemia

Diogo Godinho, 20 anos, encontra-se no último ano da licenciatura de Gestão, na Universidade Lusófona do Porto. 

O aumento de casos da Covid-19 e, por consequência, a tomada de decisão de aulas em regime à distância fizeram com que, no ano anterior, cancelasse a viagem e optasse por ficar em Portugal, mesmo já com o processo concluído. Embora, afirme ter perdido “uma ótima experiência de vida e também futuramente profissional”, acredita que esta decisão foi a mais sensata, visto que, se trata de “uma questão de saúde pública que em nada me levaria a beneficiar da experiência. Ia estar sempre limitado.”

Diogo, reitera que estando a terminar o curso, já não faz sentido voltar a candidatar-se ao programa Erasmus.

Testemunhos de quem a pandemia não cortou as asas

Beatriz em Bilbau. Fotografia cedida pela entrevistada.

Beatriz Pereira, 19 anos, estudante do 2º ano, no curso de Ciências da Comunicação: Jornalismo, Assessoria e Multimédia, na Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP), encontra-se a fazer Erasmus em Bilbau, Espanha.

Se antes de embarcar nesta aventura as expectativas já eram altas, depois de lá estar admite que superaram a todos os níveis e que esta foi, “sem exagero”, a melhor experiência que podia ter pedido. A contribuir para este balanço positivo, está a superação dos objetivos que a levaram a candidatar-se ao programa de mobilidade. 

Beatriz assegura que a pandemia não afetou num todo a experiência em Bilbau, visto que, os cuidados básicos de proteção permitiram ter um Erasmus “bastante normal” que “se equiparou às histórias que ouvia.”

Foi nas reuniões da praxe online que a partilha de histórias, por parte de quem se encontrava em Erasmus, impulsionou a estudante a iniciar o processo, aconselhando-se acerca das equivalências a fazer. O que é certo, é que os receios associados à pandemia de Covid-19 fizeram com que o desejo de embarcar nesta aventura se fosse distanciando e a candidatura só fosse submetida, juntamente com a de um amigo, dez minutos antes do prazo terminar. “Tive de arriscar. Acabei por vir sozinha o que foi uma dinâmica totalmente inimaginável na minha cabeça, mas que agora não imagino de outra forma, sinceramente.” 

Diogo Dias, 21 anos, licenciado em Ciências da Comunicação pela Universidade Lusófona do Porto, abraçou a experiência do programa Erasmus no segundo semestre, do último ano da licenciatura. Budapeste, capital da Hungria, foi o destino escolhido pelo estudante para viver a experiência que classifica como a “mais marcante da minha vida!” 

Considera que, na fase inicial, ter feito Erasmus em tempos de pandemia tornou a experiência mais desafiante por estar em vigor um recolher obrigatório às 20 horas. Contudo, tal acontecimento não prejudicou, de todo, a experiência pois foi-se adaptando às circunstâncias. “Fazíamos coisas diferentes, nessa altura, que não fazíamos no fim. Foi uma adaptação constante que até se tornou necessária para não cair no engodo.”

De forma mais sucinta, de todo o processo que estas situações exigem, para o estudante, o mais difícil foi o pré-viagem, uma vez que, “lá [em Budapeste] foi tudo muito simples”. Para finalizar, deixa a certeza de que repetiria tudo o que viveu naqueles cinco meses.

Thaís Manhães, 23 anos, está no terceiro ano do curso de Ciências da Comunicação, vertente de jornalismo, na Faculdade de Letras da Universidade do Porto. 

Depois da aventura em Saragoça, a estudante constata que os aspetos positivos “são tantos que se sobrepõem aos negativos.” O aperfeiçoamento da língua espanhola, o acesso a novos autores, a novas formas de ver o jornalismo e o conhecimento do mundo que adquiriu ao ter estado em contacto com pessoas de diferentes partes do mundo, colmatam o facto da experiência (“festas, eventos em geral”) ter ficado comprometida à conta das restrições impostas pela pandemia. Com isto, quer dizer que a Covid-19 “intensificou a adaptação”, mas sem descurar o facto de acreditar que, num contexto pandémico, a adaptação se impõe onde quer que esteja. 

“Acredito que a vivência Erasmus, quero dizer, o facto de mudar de país, é sempre desafiante. Nova língua, nova cultura, novas visões de mundo, novos lugares… tudo isso nos obriga a sermos novos também, sermos, de certa forma, um outro.”

Segundo a Agência Nacional Erasmus, de 2014 a 2017, o número de estudantes a aderir ao programa de mobilidade, em todo o mundo, foi subindo gradualmente. A partir de 2018 a tendência inverteu-se e foi no ano de 2019 que se registou o maior decréscimo dos últimos tempos. Em 2020, embora a queda não tenha sido tão acentuada como no ano transato, a tendência decrescente manteve-se.

Quanto às instituições candidatas de Portugal, a Universidade do Porto lidera a tabela com um total de 9836 participantes registados, de 2014 a 2020. Segue-se a Universidade de Lisboa com 8012 e, somente em sétimo lugar, surge a primeira instituição privada, a Universidade Católica Portuguesa com 3671 participantes.

Quanto às instituições recetoras, de todo o mundo, é também a Universidade do Porto a assumir o primeiro lugar do ranking, com um total de 902 participantes registados.

De salientar que, entre 2014 e 2020, foram 102555 os alunos que decidiram fazer Erasmus. O país que mais estudantes recebeu ao longo deste período foi Espanha (21523), seguida de Itália (13259), Polónia (9537), Alemanha (5572), República Checa (5257), França (4915), Reino Unido (4480) e, em oitavo lugar do ranking, Portugal (4038).

Ruben Marques

Chamo-me Ruben Marques, tenho 20 anos e sou de Gondomar. Decidi seguir o curso de Ciências da Comunicação, uma vez que, foi a área que sempre me fascinou e é o que me vejo a fazer no futuro.