Estratagemas para contornar a Lei da Paridade deixa mulheres para trás
A Lei da Paridade pensa em tudo?
De acordo com Palmira Maciel, em “todas as leis encontramos sempre lacunas.” As leis estão longe da perfeição. Nunca vão agradar a gregos e a troianos. Já Rosa Monteiro considera que a lei não tem lacunas, esse é um “problema dos partidos” e uma “desculpa que eles inventam”.
“Temos de cumprir a lei que temos até ela ser melhorada”
Ângelo Neves, Jurista para a Comissão para a Igualdade de Género
Para Joana Mortágua, deputada do Bloco de Esquerda [BE], a resposta é simples. Os partidos, ao estarem confortáveis com “grupos parlamentares que são obviamente desiguais do ponto de vista da representação de género, os eleitores também têm de retirar daí consequências políticas.”
A deputada que representa o BE crê que é importante refletir sobre as questões da paridade, percebendo “se [esta] pode ser alargada”, mas alerta que “terá sempre limites e esses limites são sempre apontados pela vontade dos partidos – e isso também diz alguma coisa sobre os próprios”.
CURIOSIDADE… A Constituição da República Portuguesa, na versão aprovada em 1976, inclui duas referências a mulheres, ambas na qualidade de trabalhadoras e relativas à proteção durante a gravidez e o parto [alínea c) do artigo 54.º e n.º 2 do artigo 68.º]. A menção explícita apenas nestes artigos, não significa que o legislador constituinte tenha ignorado ou proferido a questão da igualdade, que foi expressamente prevista no artigo 13.º. Determina este artigo que ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão – entre outros – do sexo. |
“Hoje em dia ninguém ousa questionar as Leis da Paridade, senão não tínhamos esta quantidade de mulheres na política, na local ou a nível nacional ou europeu”
Rosa Monteiro
Para que esta mudança seja mais significativa, os partidos têm que proceder a uma “mudança de cultura” e “criar redes de mulheres na política, e até o ideal é que fossem redes suprapartidárias”- desenvolver uma ideia acima do partido, atendendo aos ideais de todos os partidos – afirma a antiga secretária de Estado, Rosa Monteiro. Abrir portas para que entrem no mundo político e ter consciência de que “com as suas capacidades, competências e vontades conseguem fazer isto, de uma forma muito bem feita, de igual para igual, homens e mulheres”, declara Palmira Maciel, deputada do Partido Socialista.
Política de Quotas “As quotas funcionam um pouco como uma alavanca temporária, como um acelerador”, Nuno Gradim A Lei da Paridade “foi a primeira lei do nosso país a afirmar precisamente uma forma política de igualdade que é difícil de legitimar até para a opinião pública geral e que é criação das chamadas quotas”, diz Rosa Monteiro. Mas o que é isto de “quotas”? Inicialmente a Lei da Paridade era conhecida como a Lei das Quotas. Esta era a sua designação porque “tinha de preencher uma percentagem, uma quota”, declara Ângela. Definia a “percentagem de mulheres em relação ao número de homens.” Uma “alavanca para promover [as] questões da igualdade.” A política das quotas é “neutra”. Nuno Gradim, técnico da Comissão da Cidadania para a Igualdade de Género [CIG] refere que estas “não são quotas para as mulheres”, mas “para o sexo sub-representado.” A verdade é que “são as mulheres que estão sub-representadas, mas considero que é uma alavanca e é um acelerador para corrigir distorções que foram alimentadas pelo estereótipo, por preconceitos porque o espaço público sempre foi atribuído ao homem e o espaço privado à mulher”, diz. De eleição a eleição, esta política é um memorizador do papel das mulheres. |
Existem algumas dificuldades que podem ser encontradas na aplicação da lei. Para Ângela Gomes, a principal prende-se com a escolha dos membros de composição da lista, já que são obrigados “a escolher pessoas que integram a lista por género e não por capacidades”. Apesar disso, a advogada acrescenta que “se for uma mulher a fazer uma lista, provavelmente, vai conhecer até mais mulheres ou pelo menos com quem tem mais afinidade; se for homem é exatamente a mesma coisa, tendo em consideração que ambos os géneros são aptos para desempenhar as mesmas funções.”
Mas como damos a volta a estes estratagemas? Segundo a advogada Ângela Gomes, são distintos os órgãos que asseguram o cumprimento da Lei da Paridade. No caso de eleições para o Parlamento Europeu ou para a Assembleia da República, “é o Tribunal Constitucional”. Quanto aos órgãos locais, compete aos Tribunais de Primeira Instância.
Ainda assim, Rosa Monteiro considera que, “além da rejeição das listas, a penalização devia ser superior, devia haver formas de valorizar, até nos financiamentos dados aos partidos, quem tenha realmente melhores resultados em termos de efetividade da lei.” Antes da atualização de 2017, os partidos podiam recorrer ao pagamento de coimas para incumprirem esta lei, algo que a ex-Secretária de Estado considera uma “aberração completa”.
Quando se consideram as listas após a tomada de posse e todas as trocas efetuadas, “se as coisas forem feitas com consentimento não há muito a fazer”, afirma Palmira Maciel. Cabe aos partidos a responsabilidade de “trazer mais mulheres para a política, de fomentar a vontade das mulheres na política, de ajudar e retirar alguns obstáculos”.
O povo tem um papel decisivo, no ponto de vista de Joana Mortágua. “Se o povo decidir eleger sete cabeças de lista em círculos eleitorais onde o partido só apresentou homens significa que esse partido só vai estar representado por homens, e não podemos desvirtuar a decisão do povo alterando a lista que foi apresentada”.
Rita Almeida, 21 anos, natural de Vale de Cambra. O gosto por comunicar e querer sempre saber mais surgiu muito cedo, definindo CC como carreira a seguir. Atualmente no terceiro ano do curso, na Universidade Lusófona do Porto, sou, também, colaboradora na editoria “Geração Z” na plataforma #infomedia.