História, glamour e exclusividade: O trajeto do Restaurante “O Escondidinho”
- Guilherme Caroço
- 19/04/2022
- Agenda e Lazer Atualidade Portugal
Um espaço icónico, ilustre e histórico. Pelas cadeiras centenárias, que ainda hoje estão de serviço, passaram várias figuras celebres. Desde o Rei Juan Carlos de Espanha e a Família Real e ainda Francisco Sá Carneiro.
[Reportagem de Guilherme Caroço]
“Aqui respira-se história”, são as palavras de Amarílio Barbosa, dono desde 2005 do Restaurante “O Escondidinho” na Rua Passos Manuel, no Porto. Prestes a fazer 95 anos, este restaurante integra a lista de estabelecimentos mais antigos da cidade do Porto. É uma passagem obrigatória para todos os entusiastas que apreciam um espaço familiar, acolhedor e para sempre memorável.

Abriu portas em 1927, no espaço onde permanece até aos dias de hoje, e “nasceu de um sonho”, relata Amarílio Barbosa. O empresário António Joaquim Silva, fundador de “O Escondidinho”, “rapidamente começou a granjear clientes de topo e foi incentivado a criar algo diferente”, foi aí que recorreu a dois dos melhores arquitetos da época, da cidade invicta, Amoroso Lopes e Manuel Marques.
O Escondidinho em 1931 | Foto cedida pelo restaurante Foto cedida pelo restaurante O Escondidinho em 1931 | Foto cedida pelo restaurante Foto de Guilherme Caroço O Escondidinho em 1931 | Foto cedida pelo restaurante Foto de Guilherme Caroço Foto de Guilherme Caroço Foto de Guilherme Caroço Foto de Guilherme Caroço
Com uma visão ambiciosa, António Joaquim Silva “dotou o restaurante do melhor”, todos os detalhes foram minuciosamente pensados. Mobilou o espaço com “a melhor casa de mobiliário da época”, os Grandes Armazéns Nascimento, e “uma das maiores casas do país em azulejaria e faianças”, a Fábrica Constância, de Leopoldo Battistini, recorda Amarílio.
“Isto nasceu para ser o melhor entre os melhores do país”
Amarílio Barbosa
Em 1936, nove anos depois da abertura do restaurante, “ele [António Joaquim Silva] conseguiu juntar uma série de pormenores que permitiram ganhar duas estrelas Michellin”, Amarílio relembra ainda que “até 1999, em Portugal, “O Escondidinho” era o único restaurante que tinha ganho duas estrelas Michellin”.

Nos anos 50, o fundador “passa” o restaurante ao filho que assumiu o projeto até 1985. Nesse preciso ano, o restaurante é vendido a Joaquim Araújo, “que trabalhou aqui cinquenta e poucos anos, desde os 13 ou 14 anos como empregado”, afirma Amarílio.
Em 2005, “O Sr. Joaquim Araújo chegou à idade da reforma, a família não quis assumir e foi convidado a vender o estabelecimento”, recorda o atual dono com a mesma alegria do dia em que comprou o restaurante. Tinha 15 anos quando ouviu falar de “O Escondidinho”, na altura, era mandarete no Hotel Império na Batalha. Gracejando, relembra que ouvia “que só vinham aqui os endinheirados”.
“Ou estamos capacitados de conduzir esta nau ou então temos de a passar a quem respeite, estime e desenvolva”
Amarílio Barbosa
À frente do restaurante há 17 anos, admite “que os tempos mudaram”, a panóplia de clientes que frequenta a casa é “muito mais abrangente” e reforça que o “projeto é consistente, sempre preservando e dignificando o nome “O Escondidinho”, confessa Amarílio. O proprietário considera “extremamente gratificante” saber que “os clientes regressam a casa exatamente como eles a deixaram” até porque o restaurante “não será o mesmo sem as cadeiras, as faianças, as mesas (…) toda a decoração é património desta casa”, acrescenta.
“Gente que dá gosto atender e servir”
O cliente até pode entrar num mau dia, mas para toda a equipa do restaurante é fundamental que “leve uma boa recordação da casa, e que saía bem-disposto”. Todos os funcionários seguem a máxima “o cliente não é só para uma vez”, a sensibilidade de percecionar todos os pormenores é uma constante no serviço personalizado prestado no restaurante.
“Um restaurante sem clientes é como um jardim sem flores”
Amarílio Barbosa
Com quase um século de história, foram muitos aqueles que elegeram “O Escondidinho” como “um porto seguro”, um local de união e de reencontros. Foi o caso, entre muitos outros, de “o rei Juan Carlos e seu pai João, Conde de Barcelona”, declara Amarílio. Nos anos cinquenta e sessenta, durante o governo ditatorial espanhol de Francisco Franco, João Conde de Barcelona esteve exilado em Estoril. Nas várias visitas que Juan Carlos fez a seu pai, “O Escondidinho” era o local predileto para se reencontrarem, ambos “gostavam muito da região norte” e “eram clientes assíduos”, acrescenta Amarílio Barbosa.
São inúmeros os clientes ilustres que já passaram pelo restaurante, clientes dos mais variados ramos e ofícios. Desde “figuras das artes e da música” como o cineasta Manoel De Oliveira, até aos ex-primeiros ministros Francisco Sá Carneiro e Mário Soares, “o restaurante não tem inclinações partidárias (…) desde a extrema-esquerda até à extrema-direita são todos bem-vindos”, conta o proprietário do restaurante.
“Clientes são família e a equipa é igualmente família”
Todos os funcionários e colaboradores que trabalham no estabelecimento conhecem a história do restaurante, o que acaba por ser uma “mais-valia” pelo peso que acarreta o nome “O Escondidinho”. Para Amarílio, é importante a estabilidade da equipa de sala e cozinha, ressalvando que aprecia a “longevidade e permanência dos funcionários”.
Um bom ambiente e familiar, é fundamental para manter a equipa contente e isso conduzirá a clientes contentes. A dinâmica envolvente na equipa é pautada por “muita flexibilidade e compreensão”, na essência “sabem que podem contar com a empresa, sendo certo que a empresa pode contar com eles”, conclui Amarílio.
“Não há dúvida que o nosso sucesso passa pela qualidade da equipa, colaboradores e parceiros”
Amarílio Barbosa
Sempre que existe uma “baixa” e a equipa necessita de ser reforçada, “existem alguns critérios e parâmetros” que são fundamentais para Amarílio Barbosa. Para integrar a equipa de “O Escondidinho”, é necessária “seriedade, muito respeito pelo cliente, muito rigor e uma personalidade sociável, com os clientes e equipa”.
“Desafio, sonho e futuro risonho”: Um olhar para o passado recente e o futuro
São com estas palavras que Amarílio descreve aquilo que deseja para o nonagésimo quinto aniversário do restaurante. Em declarações sobre o futuro do estabelecimento, reflete que é necessário “manter todo o património, preservar com muito cuidado e cada vez mais dar a conhecer esta casa”, aponta.
Já com objetivos estabelecidos, o dono do restaurante constata que o plano para o futuro próximo “passa por apostar nos clientes portuenses e portugueses”, desta forma “se nós satisfazermos plenamente os nossos compatriotas, estamos à altura de satisfazer os nossos turistas”. Uma das preocupações para Amarílio a ser corrigida e trabalhada, é a imagem que “O Escondidinho” criou, “uma imagem de muito elitista, mas na realidade se as pessoas perceberem, hoje em dia os preços já não são tão disparatados”. Já identificado, o objetivo é “absorver mais os clientes portugueses e trabalhar para eles”.
Recentemente “O Escondidinho” recebeu um galardão de loja tradição, “atribuído pela Câmara do Porto a espaços emblemáticos da cidade”, acabou por ser também um apoio e incentivo, atitude que Amarílio caracteriza como “muito interessante, dinâmica e atenta”.
Ao recordar os últimos três anos, Amarílio Barbosa relembra que em 2019 o restaurante “atingiu o máximo, foi fabuloso”, no entanto, de uma forma agridoce relembra os dois anos seguintes como “seguramente complicados”. Durante o pico pandêmico, na época que os restaurantes estavam fechados, o acompanhamento da Câmara do Porto foi fulcral, auxiliando “dinheiro a fundo perdido para melhoramentos, ações de formação, eventos e na área do marketing”. Todos os apoios e reconhecimento motivam “O Escondidinho” a continuar o seu trajeto, cozinhando e servindo “com alma”.
Guilherme Caroço, 21 anos. Sou colaborador na editoria de saúde na plataforma #Infomedia.