Joana Resende: “Não é no desporto em si que se está a propagar o vírus”

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Joana Resende: “Não é no desporto em si que se está a propagar o vírus”

Aos 19 anos, Joana Resende rumou a Paris para seguir o seu sonho, mas a pandemia obrigou-a alterar as rotinas e a prática desportiva.

Joana Santos Resende é uma jovem de 19 anos, natural do Porto. A internacional portuguesa reside em Paris e é atleta profissional de andebol do Paris 92. Relata como é viver e a jogar, durante a atual pandemia, numa cidade onde o medo e a insegurança são visíveis diariamente.

Tendo como principal referência o pai, Joana sempre sonhou e trabalhou para um dia chegar aos grandes palcos do andebol. Ingressou em 2019 no ensino superior em Lisboa, no entanto, a sua paixão pela modalidade levou-a a deixar a licenciatura e a rumar a Paris. Hoje joga num clube que atua na Ligue Butagaz Energie e na EHF European League Women. Nos últimos meses, o coronavírus obrigou a sociedade e, em particular, o desporto a alterar as suas rotinas. Durante três meses, a quarentena provocou isolamento social, uma mudança drástica na rotina dos atletas. Joana refere que é muito difícil manter a forma física e os hábitos de exercício saudáveis. A sua perda de massa muscular durante este período fez com que o regresso à modalidade fosse mais exigente, tanto a nível físico como psicológico. Também os treinos que realizava durante o confinamento não se comparam ao andebol, visto que correr na rua não é igual à corrida intermitente que acontece num jogo.

“A quarentena afetou negativamente o meu rendimento.”

Após os três meses de confinamento, o regresso à modalidade foi ansiado por todos os praticantes, no entanto, o receio de ficar infetado perdura na cabeça dos atletas. Com o aumento progressivo de infetados, França entrou em confinamento de forma a evitar o colapso dos hospitais. Regista, desde o início da pandemia, mais de 2 milhões de infetados obrigando o presidente Emmanuel Macron a decretar um novo confinamento para todo o país, de 30 de outubro a 1 de dezembro.

“Só posso ter uma hora por dia para sair de casa e preciso de uma autorização para ir treinar, que diz a que horas saí de casa para ir ao supermercado e no raio de 1km.”

A pandemia da covid-19 tem contribuído para um impacto negativo, tanto a nível desportivo como económico. A permanência em isolamento não é normal para nenhum ser humano, no entanto, é nos seres proativos e com espírito competitivo, atletas, que se denotam os maiores receios, dúvidas e inseguranças. A internacional portuguesa conta que nunca ficou em total isolamento, afirmando que quando há casos positivos, só essas pessoas é que vão para isolamento e as restantes continuam a treinar. Todavia, nesse período de tempo, os treinos foram reduzidos, a equipa foi dividida em dois grupos e resumem-se quase exclusivamente à preparação física. Estas medidas foram tomadas de forma a minimizar os riscos de contágio entre atletas, aumentando ainda os cuidados de desinfeção. Entre risos, Joana lembra que foi cómico treinar de máscara com apenas sete pessoas num pavilhão. Relata ainda que os treinos de andebol propriamente dito, só foram possíveis após a realização de dois testes e dos respetivos resultados negativos de toda a equipa. A atleta internacional confidencia o medo de testar positivo e, consequentemente, do decréscimo do seu rendimento. Trabalhou muito para alcançar novamente uma forma física favorável para o seu estilo de jogo e uma semana em isolamento afetaria a sua forma. Importa referir que o regresso aos treinos após o contágio deve ser feito de forma progressiva, “de 50% até aos 100%”.

Toda esta situação que se vive atualmente gera alterações ao nível físico mas também ao nível da saúde mental, originando sentimentos de ansiedade, medo e stress: “Estou sozinha a lidar com uma situação destas, que afeta o psicológico de um atleta e claramente não é fácil.” A permanência em casa, a ausência de liberdade, de independência e de contacto direto com familiares faz com que os atletas se sintam apreensivos com o futuro. Não é o isolamento em si que a preocupa, mas sim o facto de não ter os pais por perto e começar a necessitar da ajuda do clube. Afirma que acaba por ser um pouco assustador estar nessa situação, o que faz com que tenha mais responsabilidade para que isto não aconteça. Ao contrário de Portugal, em França é apenas uma semana de isolamento, mas são “24 horas sob 7 dias a olhar para paredes, falar com paredes”. Joana sente-se cada vez mais independente devido ao facto de viver sozinha, no entanto, se ficar infetada fica totalmente dependente de outras pessoas.

“Acho que o facto de termos feito jogos com público foi algo que piorou a situação.”

No início da época, a federação permitia, seguindo todas as medidas de segurança, a presença de adeptos nos pavilhões, no entanto, estas medidas nem sempre foram cumpridas. Nos jogos realizados no pavilhão do Paris 92, Joana afirma que todas as medidas de segurança foram tomadas, o que a leva a acreditar que “não é no desporto em si que se está a propagar o vírus”. No entanto, este cenário não foi visível em todos os pavilhões, nos jogos da Liga Masculina e da Liga dos Campeões, as bancadas estavam cheias, não cumprindo as medidas de segurança. Com o aumento significativo de casos em França, a federação francesa de andebol deixou de permitir a presença de adeptos nos jogos e obrigou o adiamento ou cancelamento dos jogos a partir de três casos positivos na equipa. Joana sublinha que desde a pré-época que se vive uma situação de instabilidade no que diz respeito aos casos positivos em equipas, considerando que esta situação acaba por ser como uma “bola de neve”, visto que desde a pré-época que têm jogos cancelados devido a casos positivos.

Tal como todas as outras ligas profissionais, a Ligue Butagaz Energie exige a realização de testes à covid-19. Desde o início da época que é feito, pelo menos, um teste todas as semanas. No entanto, se tiverem jogo do campeonato durante a semana e competições europeias no fim de semana, realizam um para o jogo do campeonato e um adaptado para as competições europeias. Esta obrigatoriedade imposta pela federação francesa e pela European Handball Federation permite um controlo de casos positivos e evita um contágio progressivo entre equipas. Sendo assim, as competições não param, à semana acontecem os jogos do campeonato e ao fim de semana os jogos da taça francesa e os das competições europeias. No que diz respeito às jornadas europeias, as equipas tentam minimizar as deslocações jogando os dois jogos da eliminatória num só local. A jogadora do Paris92 conta que, na segunda eliminatória, a sua equipa e a equipa adversária fizeram um acordo e os dois jogos foram disputados em Paris.

O mundo do desporto foi altamente afetado pela situação mundial, mas na época em vigor, as federações decidiram manter as planificações normais, mesmo com a continuidade da pandemia e o elevado números de infeções. Por fim, Joana afirma que a situação que se vive em França é assustadora e preocupante e que o seu medo foi aumentando com as várias fases da pandemia.

Fotografia cedida pela jogadora | JR

Joana Santos Resende

  • Nasce a 23-03-2001 no Porto
  • 2008/2009: Ingressa na modalidade no C.A. Leça
  • 2013/2014; 2015/2016: Vence dois campeonatos nacional de Iniciados ao serviço do C.A. Leça
  • 2017/2018: Ingressa na equipa do Colégio de Gaia
  • 2018/2019: Vence o campeonato nacional 1ª divisão de Seniores Femininos ao serviço do Colégio de Gaia
  • 2018/2019: Vence a Taça de Portugal Seniores Femininos ao serviço do Colégio de Gaia
  • Na época de 2018/2019 participa na qualificação para o Mundial Feminino de Andebol ao serviço da Seleção Sénior.
  • 2019: Participa no U19 Women´s EHF Euro 2019
  • 2019: Ganha o prémio de Melhor Marcadora do U19 Women´s EHF Euro 2019
  • 2019: Conquista o prémio de Atleta Revelação atribuído pela Federação de Andebol de Portugal.
  • 2019/2020: Assina contrato de formação ao serviço do SL Benfica.
  • 2020/2021: Assina contrato profissional ao serviço da equipa francesa Paris 92