Lourenço Hecker: “São os dois muito importantes nas suas variadas formas, mas não estão diretamente ligados.”

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Lourenço Hecker: “São os dois muito importantes nas suas variadas formas, mas não estão diretamente ligados.”

[Por Ana Catarina Gomes e Ana Jorge]

Lourenço Hecker | Fotografia via Instagram

Lourenço Hecker é licenciado desde 2021 em Ciências da Comunicação, pela Universidade Lusófona do Porto. Atualmente, trabalha como Community Manager na Rádio Comercial. Na rede social Tik Tok, onde se apresenta com o nome “LoryHecker”, conta com mais de 150 mil seguidores. Lourenço é um dos convidados da sétima edição da conferência anual Jornalismo Frankenstein, que irá decorrer na Universidade Lusófona do Porto, no dia 26 de abril de 2022 das 10:00 às 18:30.


1 – O que é para ti entretenimento? E o que é para ti jornalismo? Há ou deverá haver uma diferença clara na tua perspetiva?

Sim, eu penso que sim. Acho que o entretenimento é algo que nós usamos para nos “desligarmos” a qualquer momento. É uma coisa que nós procuramos naturalmente e que é necessária para nos sentirmos bem. Mesmo na nossa rotina, de uma forma ou de outra, nós estamos sempre em contacto com entretenimento. A meu ver, a sua finalidade é tirar algum peso das pessoas e garantir sempre que a pessoa que o procura encontra aquilo que procurou de início, algum alívio e conforto. Acho que esse é o papel essencial do entretenimento. Por outro lado, o jornalismo não pode escolher aquilo que quer informar, porque a informação vem como ela é. A informação vem maciça e o dever do jornalista é informar. Como é óbvio, a pessoa também pode ir à procura de informação, e cada vez mais há algoritmos especializados para dar às pessoas a informação que elas procuram diariamente, mas também há aquela informação com a qual nós, de uma forma ou de outra, nos vamos deparar (por telejornais e/ou por títulos que nos aparecem nas notícias online). Portanto, há coisas que nem sempre vão ao nosso encontro e não vão ser do nosso gosto, mas acho que é esse o papel do jornalismo – informar. Não há, necessariamente, qualquer tipo de ligação com o entretenimento. 

No meu trabalho, enquanto Community Manager, eu também tenho o dever de garantir que nós, sendo uma rádio, temos esse papel de informar de alguma forma. Vamos ver as notícias que temos no nosso site e falamos diariamente com os jornalistas. Muitas vezes é necessário alterar alguns títulos para torná-los mais apelativos para o tipo de audiência que nós temos. É, precisamente, por causa disso que o papel do Community Manager é tão importante – para garantir que um título não vai mudar o tipo de comunicação que tivemos até agora. Não queremos assustar as pessoas e estar a desassociar totalmente o conceito que criámos até agora, não há necessidade. Tentamos sempre conciliar isso com os jornalistas e eles também já o fazem dessa forma, porque fazer jornalismo também vai depender um bocado dos métodos do meio de comunicação em que se está inserido. Na rádio acho que há muito essa ligação entre jornalistas e equipa digital. Nós falamos diariamente e eles mandam sempre muito conteúdo, porque nós estamos encarregues do entretenimento, mas não podemos nunca descuidar que tem de haver essa ligação com a informação. Eu acho que eles [jornalismo e entretenimento] são os dois muito importantes nas suas variadas formas, mas não estão diretamente ligados. 


2 – Na tua opinião, em que medida existem más práticas jornalísticas que afastam as pessoas da informação e as aproximam do entretenimento?

Eu acho que isso tem tudo a ver com a lei da procura, ou seja, a pessoa procura aquilo que quiser e acho que a pessoa procura entretenimento para uma coisa e procura jornalismo para outra. Se alguém está à procura de jornalismo para encontrar entretenimento, não acho que seja, na minha opinião, a melhor decisão, especialmente em Portugal, em que o jornalismo é feito num código deontológico bastante diferente dos Estados Unidos, por exemplo. Aí sim há mais liberdade de expressão política naquilo em que se acredita. Em Portugal não há tanto essa liberdade. Há um dever, que é informar na sua essência. Portanto, não há abertura para entretenimento ou qualquer tipo de animação que possa ser feita num telejornal, dado que isso desrespeitaria totalmente o código deontológico. 

Eu trabalho num órgão de comunicação, a rádio, que é um meio de difusão, de entretenimento, mas também tem informação. Há órgãos que proporcionam essas duas, mas são dois tipos de conteúdos totalmente diferentes, não há uma ligação.


3- Na sua perspetiva, o facto do jornalismo, por vezes, se “misturar” com o entretenimento não acaba por tirar alguma credibilidade ao verdadeiro ato de jornalismo?

Eu acho que essa é a pergunta de 1 milhão de euros! Eu acho que tentar fazer as duas coisas pode correr muito mal e pode descredibilizar uma coisa ou a outra. Acho que quem faz entretenimento não tem tanto essa preocupação. Pelo menos, do que eu vejo, há a preocupação de estar informado, mas não há necessidade de informar. Essa necessidade não devia estar tão presente, porque a partir do momento em que temos essa necessidade e queremos fazer parte desse dever, já estamos a entrar num território no qual acredito que possa haver pessoas que descredibilizem esse conteúdo e esse trabalho jornalístico, precisamente por estar a tentar alcançar duas coisas que são diferenciadas por natureza. Não há uma ligação direta entre as duas. Nunca houve e tendo esse estigma à volta de “entretenimento é uma coisa e jornalismo é outra”, acho que pode haver pessoas que não gostam e que não vêm o conteúdo como fidedigno ou mesmo como conteúdo sequer. Mas há pessoas que já o fizeram e acredito que haja alguém que consiga. Também acho que uma coisa que pode funcionar é uma forma diferente de fazer notícias e talvez um pouco mais apelativas na forma de fazer o texto (mais curtas). Hoje em dia, com o ciberjornalismo, há muito essa importância de fazer, cada vez mais, as peças mais curtas, mais sucintas, tentar ao máximo que toda a informação fique só mesmo o sumo da informação, porque isso acaba por ser o conteúdo, ou seja, o fast content é importante. É uma coisa que tanto o entretenimento, como o jornalismo têm em comum. As pessoas querem conteúdo rápido, conteúdo fácil e que consigam consumir rapidamente, porque tudo acontece muito rápido e queremos passar sempre para o próximo. O mesmo acontece com as notícias. As pessoas procuram notícias e querem ver sempre a próxima. Portanto, se houver algum tipo de parecença entre as duas, a meu ver, é essa. É o conteúdo rápido e mais apelativo, mas nunca entrando em conceitos base do entretenimento, que é opiniões e lifestyle. Acho que isso já não é jornalismo no dever de informar, já são ramificações que não sei até que ponto é que podem ser consideradas jornalismo maciço, portanto, acho que é um território um bocado perigoso. Quem se quiser aventurar que o faça e pode correr muito bem, mas, a meu ver, não me vejo, tão cedo, a fazer uma coisa do género.


4- Porque escolheu jornalismo e depois optou pelo entretenimento?

Eu, toda a minha vida, achei mesmo que era jornalismo que eu ia fazer e eu tenho uma paixão gigante pelo jornalismo. Estudar jornalismo foi fantástico e, quem sabe um dia, voltarei lá, mas o entretenimento sempre foi o meu refúgio. Então eu pensei, se isto for a minha vida um dia mais tarde, então eu vou estar sempre feliz, porque vou poder fazer isto todos os dias e se calhar é mais isto que é o meu chamamento. A decisão não foi fácil, foi o meu último ano de licenciatura todo nessa luta. A certa altura até assessoria e marketing estavam em jogo. Foi uma decisão um bocado complicada, mas rádio e redes sociais sempre foram a minha paixão. Rádio é um meio gigantesco, há tantas formas de fazer rádio diferentes (rádio novelas; rádios de informação; rádios de música, etc.). Assim sendo, eu pensei: é isto que eu quero fazer, rádio é a minha paixão e redes sociais também e se, de alguma forma, eu conseguir conciliar as duas, então é isto. Acho que foi um bocadinho exclusão de partes e ao mesmo tempo ouvir o meu coração e o meu cérebro e perceber que talvez jornalismo, não é que não seja para mim, mas, talvez, nesta etapa da minha vida, não seja a melhor opção. Mas fiquei muito contente por, mais tarde, descobrir que, no meu trabalho, estou em constante comunicação com os jornalistas e consigo, também, perceber o trabalho que eles fazem. O meu trabalho enquanto Community Manager é, também, rever essas peças jornalísticas e perceber se elas se adequam numa publicação àquela hora e se aquilo é interessante para publicar ou se vive só no site. Lá está, está sempre aqui acordado esse amor pelo jornalismo e esse trabalho diário acaba sempre por ser feito, não diretamente, mas indiretamente. Isso deixa-me muito contente.


5- De que forma é que o jornalismo lhe deu ferramentas para o entretenimento?

Eu nunca estive em jornalismo diretamente enquanto jornalista, mas as ferramentas que eu tive enquanto estudante universitário de jornalismo foram cruciais para, hoje em dia, eu talvez “passar alguns passos à frente” na minha aprendizagem enquanto Community Manager, na Rádio Comercial. São pequenas coisas que eu ouvia nas aulas e pequenos tiques de linguagem que eu fui corrigindo. Por exemplo, a professora Vanessa Rodrigues trabalhava muito connosco a importância de resumirmos os nossos textos, de sermos sucintos e de tornarmos o nosso texto apelativo. Um dos meus trabalhos também é escrever artigos para um dos nossos programas, o “Era o que faltava”, que é uma hora de entrevista com vários convidados todos os dias e um dos meus deveres é escrever um artigo que fica disponível abaixo do episódio da rubrica, que é explicar a conversa por alto, para pessoas que, naquele momento, não tenham a possibilidade de ouvir a conversa, mas querem ler um bocado do texto para perceber se mais tarde, quando tiverem tempo, lhes interessa. Acho que isso de resumir e tornar apelativas as peças jornalísticas que fui fazendo ao longo dos anos, principalmente no #infomedia, onde começou o meu percurso jornalístico, contribuiu porque acaba sempre por ser mais bem recebido e ter uma melhor performance, precisamente porque as pessoas estão à procura de alguma coisa que consigam ler rápido. Mas o mais importante foi o facto de todos os meus professores me terem passado a necessidade de sair da minha zona de conforto, através de exercícios que foram propondo ao longo do curso. Considero que, hoje em dia, no mercado de trabalho, estou mais aberto a desafios e a sair da minha zona de conforto, porque já tive esse alicerce e essa base no jornalismo. Portanto, eu acho que há muitas bases no jornalismo que são muito importantes, não só no entretenimento, como na vida profissional no geral.

O que eu costumo dizer sempre a toda a gente que vai entrar para o mercado de trabalho e que também tem essa ambição de fazer parte de uma equipa numa empresa grande e com nome, como é a Rádio Comercial e como são tantas outras, é mesmo darem-se ao dispor de conseguirem sair da vossa zona de conforto.

Ana Jorge

Sou a Ana Jorge e tenho 21 anos. Atualmente, frequento a licenciatura de Ciências da Comunicação na Universidade Lusófona do Porto e trabalho como manequim profissional na Best Models SA. Para o meu futuro, ambiciono trabalhar em entretenimento televisivo, em rádio e em representação.