Jovens: da sala de aula para o mundo de trabalho

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Jovens: da sala de aula para o mundo de trabalho

[Texto de Rita Almeida]

Em Portugal, os jovens representam um grupo etário vulnerável na relação que desenvolvem com o mercado de trabalho, já que, muitas vezes, têm pouca ou nenhuma experiência, o seu nível de escolaridade pode ainda não ser o procurado pela maioria das empresas e apresentam uma maior probabilidade de obter contratos instáveis – o chamado “ficar à experiência”.

O mundo de trabalho é vasto, mas são os mais novos que têm cada vez mais qualificações e se deparam com menor número de oportunidades e remunerações baixas. O desemprego jovem mostra-se como o ponto mais marcante da relação dos jovens com o mercado de trabalho, representando uma linha ténue entre entender e ser entendido. Durante a pandemia a taxa de desemprego geral não aumentou significativamente, mas se nos aproximarmos, vemos que foi entre os jovens que mais cresceu – 18,3% em 2019 para 22,6% em 2020.

O observatório do emprego jovem destaca a importância de se criar um “um pacote de medidas que incentive, quer o setor privado, quer o público, a contratar os mais jovens e a apostar na sua formação a longo prazo” como forma de evitar que jovens procurem áreas que não as deles, onde até encontram salários mais baixos e lhes são exigidas menos qualificações.

– Desemprego jovem em Portugal

Os dados relativos ao desemprego jovem representam a percentagem de desempregados na faixa etária dos 15 aos 24 anos no total da força de trabalho nessa faixa etária, que inclui os jovens empregados e desempregados, mas não os economicamente inativos.

Retirado de cc.europa.eu

Em 2008, com a chegada da crise financeira que atingiu Portugal, um dos temas que mais passou a preocupar os governantes foi o desemprego, nomeadamente o desemprego jovem. De facto, no ano de 2008, a taxa de desemprego jovem situava-se nos 16,7%, valor que disparou e assumiu o seu pico em 2013, quando bateu quase nos 40%. Nos últimos anos, observamos uma tendência decrescente, que voltou a ser agravada com a pandemia e que assentou nos 22,6% no ano de 2020.

Dados retirados de pordata.pt e bstat.pt

De acordo com dados divulgados pela pordata, desde 2000, ano em que a taxa de desemprego jovem era de 8,6% que a tendência tem sido subir. Em 2008, a taxa de desemprego jovem indicava que 16,7% da população jovem entre os 15 e os 24 anos estava desempregada, com o pico a ser registado em 2013 quando atingimos 38,1%. A partir de 2013, dá-se início a um decréscimo do desemprego que volta a atingir o seu valor mais baixo em 2019 com 18,3%. Já em 2020, devido à pandemia da covid-19 que atingiu todo o mundo, há um aumento de 4,3 pontos percentuais, colocando a taxa de desemprego jovem nos 22,6%.

Dados retirados de bstat.pt

No que diz respeito ao ano de 2021, a informação divulgada até ao momento diz respeito aos primeiros três trimestres, onde se observa uma tendência de diminuição da taxa de desemprego jovem a cada três meses, e igualando a taxa de 2020 no 3º trimestre de 2021.

Nuno Gonçalves | fotografia cedida pelo mesmo

Com taxas tão elevadas e com tantos jovens que procuram cada vez mais conseguir o seu lugar no mundo laboral, as formas de pesquisa existentes tornam-se insuficientes. Nuno Gonçalves, recém-licenciado em Ciências da Comunicação no ramo de jornalismo considera que o retorno de toda a pesquisa que tem feito nos diversos websites e páginas de oportunidades não é o ideal e resume-se a “respostas de consideração e agradecimento pelo interesse demonstrado em trabalhar na respetiva empresa.”. Este retorno leva os mais jovens a saírem da sua área e procurarem fora da mesma por uma oportunidade. Marco Campos, também recém-licenciado em ciências da comunicação afirma que não sentiu que existisse realmente nenhuma hipótese de conseguir ingressar na área que escolheu, optando então por expandir horizontes e começar a selecionar áreas diferentes “Quando procurei fora da área não me interessei no que ia trabalhar, mas sim nos horários/salário.”.

Para Nuno Gonçalves e Marco Campos, a maior dificuldade até agora foi “A não resposta da maioria das empresas a que me candidatei.” e “conseguir entrar sem algum empurrão.”, já que o mundo de trabalho se apresenta como um espaço onde são necessárias garantias quando as oportunidades se apresentam escassas. 

“Não tens a experiência, mas também ninguém te dá a hipótese de a adquirires.”

Marco Campos, 23 anos

O desemprego jovem é um valor que afeta a maioria dos jovens em algum momento da vida deles, obrigando a uma maior procura e empenho, mas que também obriga a que as empresas de contratação abram horizontes e permitam que a experiência não seja uma condicionante desde o início. Marco Campos realça isso mesmo ao relatar as entrevistas que já teve. “Se há um candidato com mais experiência que nós, é preferido em detrimento dos restantes”. Estamos perante o ciclo vicioso do desemprego jovem.

A importância do nível de escolaridade

Na sociedade atual há quem defenda que a solução para evitar o desemprego jovem e aumentar a empregabilidade nestas faixas etárias passa por ingressar, obrigatoriamente, no ensino superior. Mas também há quem diga que ter um curso superior pouca ou nenhuma diferença faz. Para João Costa, a prioridade foi o emprego em detrimento dos estudos. Atualmente com 30 anos, entrou no ensino superior, mas não o terminou por não conseguir conciliar o trabalho com os estudos. A oportunidade “apareceu em casa” e estar numa área que o deixa feliz e onde faz o que gosta, foi a prioridade. 

Nesta perspetiva, e no contexto português, o nível de escolaridade apresenta-se cada vez mais como um fator de divisão de jovens candidatos.

Entre 2019 e 2020 observou-se um aumento da taxa de desemprego jovem em todas as suas vertentes, com uma maior expressão no sexo masculino, onde aumentou 5,5 pontos percentuais. 

Em 2019, é o sexo feminino que apresenta sempre os valores mais elevados, com destaque para as jovens que concluíram o ensino superior, que representa uma taxa de 24,7%, valor que é superior aquele que diz respeito a jovens do sexo masculino com ensino básico, 22,2%. Foram sempre aqueles que têm o ensino básico os mais prejudicados. 

Em 2020, a taxa de desemprego jovem aumentou nas três variáveis avaliadas, com destaque para os jovens do sexo masculino que representam o valor mais elevado de 21%. A única diminuição registada diz respeito a jovens do sexo feminino com ensino superior, que representou uma quebra de 0,9 pontos percentuais. 

Um escalão que também pertence ao setor jovem é aquele entre os 25 e os 29 anos, onde conseguimos observar valores consideravelmente mais baixos em todos os setores avaliados, como é o caso da taxa de desemprego jovem total que baixa 10 pontos percentuais. Além disso, destaque para o setor feminino, em 2020, que apresentam as maiores diferenças quando comparando as duas tabelas. Ainda em 2020, foi também nas jovens do sexo feminino no escalão etário dos 25 aos 29 anos e com ensino superior o único caso onde existiu uma diminuição do desemprego.

O nível de escolaridade apresenta-se como fator de influência nas contratações já que, os valores mais altos de desemprego se verificam no ensino básico. Apesar disso, também é possível entender que se dá uma atenuação dessa diferença entre o ensino superior e secundário, já que a disparidade entre os valores, na maioria dos casos, não é significativa.

Ainda dentro do tema pandemia, inicia-se em 2020 uma inversão da tendência de diminuição do desemprego que se verificava nos últimos anos. Apesar de também o desemprego total ter aumentado, foi no desemprego jovem que se notou um ritmo mais acelerado. Assim, importa saber se este aumento será um momento passageiro consequente da crise pandémica que se atravessa, ou se estaremos perante uma tendência de subida que se enraizará na sociedade a longo prazo. 

O 1º trimestre de 2021 indica que a tendência de crescimento se irá manter, face aos valores apresentados em 2020. As mulheres são o grupo mais preocupante, com taxas substancialmente superiores àquelas registadas pelos homens, uma diferença de 11,8 pontos percentuais. O ensino superior apresenta valores constantes entre os três campos em análise e o ensino básico continua a ser aquele que apresenta valores mais altos de desemprego. Por último, importa referir que, tal como em 2020, a tendência de homens com ensino básico apresentarem menor taxa de desemprego do que mulheres com ensino superior se mantém.

Numa época que se apresenta tão complicada para os jovens, a força de trabalho portuguesa tem sido, em termos de estrutura, caracterizada por baixos padrões de escolaridade. Não obstante, tem-se verificado um aumento considerável da escolarização dos trabalhadores, em paralelo com a alteração das exigências que ocorrem no mercado de trabalho através da modernização dos setores com tecnologia. Estes desenvolvimentos refletem-se no défice ou no excesso de escolaridade apresentados para a função desempenhada. Estamos perante fenómenos de subescolarização e sobre escolarização que acarretam custos na economia, assim como podem influenciar direta ou indiretamente a produtividade das empresas. 

Teresa Soares, revisora oficial de contas e sócia da sociedade Santos Vaz Trigo de Morais e Associados, LDA, afirma que a estratégia da área é contratar recém-licenciados para que possam progredir, gradualmente, na carreira, enquanto Pedro Moreira, Diretor Geral na empresa PALMO Produções defende que o importante é “contratar com vontade de trabalhar e aprender, a experiência pode ser adquirida ao longo do percurso”. Duas perspetivas distintas, que mostram que em Portugal o nível de escolaridade se apresenta como importante nas áreas que obrigam a um conhecimento prévio e específico para a função, enquanto noutras o destaque vai para o desempenho da pessoa na função que alcançou, independentemente do nível de escolaridade.

Um passo mais perto

A taxa de empregabilidade jovem é a percentagem de jovens entre os 15-24 anos e os 25-39 que adquiriram emprego na totalidade da faixa etária

Retirado de cc.europa.eu

Apesar das altas taxas de desemprego jovem, 23,3% de jovens entre os 15 e os 24 anos estão empregados em 2020, valor 4,6 pontos percentuais mais baixo que em 2019. 

A aquisição de um emprego tanto pode ser feita através de estágio, como de uma procura constante, acabando o jovem na própria área ou até mesmo numa área que não se relaciona com a sua, com o intuito de se inserir no mercado de trabalho.

Maria Morais, 22 anos | fotografia cedida pela mesma.

O estágio curricular ou profissional, quando bem fundamentado, apresenta-se como uma importante componente no processo de formação académico e profissional. O jovem é confrontado com a inserção no mercado de trabalho através da sua participação em situações reais de trabalho e nas quais todas as decisões vão contar de forma séria e com efeito na sociedade. De acordo com Bárbara Anjos, atualmente a estagiar na sociedade de revisores oficial de contas Santos Vaz Trigo de Morais e Associados, LDA um estágio é “um primeiro contacto essencial de modo a perceberem se é realmente a área que querem desempenhar, bem como iniciar os primeiros passos de aprendizagem das bases”. Apesar das vantagens, um estágio não é fácil de obter. Convite direto, envio de currículos, concursos ou parcerias entre empresas e faculdades. Todas estas se apresentam como formas de adquirir um estágio. Maria Morais, licenciada em ciências da comunicação na vertente de assessoria, relembra que após concluir a licenciatura em junho, apenas em dezembro encontrou uma oportunidade de estágio profissional “através de um site dedicado a oportunidades de emprego, tendo ficado colocada permanentemente na empresa em janeiro de 2021.”. 

Barbara Anjos, licenciada em Gestão, relembra que um dos pontos a ter em conta quando um jovem deseja ser contratado são as experiências extra, considerando-as uma mais-valia para qualquer pessoa “Novas experiências, modos de ver a vida, saber lidar com todo o tipo de pessoas, aprender a ter empatia, entre outros aprendizados, moldam uma pessoa para melhor e a ter outra força e maneira de ver as situações. Tais experiências fazem amadurecer.”.

De uma maneira geral, e apesar de os estágios serem ótimas formas de fixar estudantes no mercado de trabalho, também se verifica que estágio não é sinónimo de emprego efetivo, estando por vezes a ser usado pelas empresas como uma forma de dar flexibilidade ao trabalho e diminuição de gastos, através da contratação de mão de obra qualificada a custos mais baixos. 

“As condições de trabalho do mercado português quer ao nível monetário quer ao nível de condições oferecidas é bastante limitado.”

Ana Cristina Correia, 23 anos

Dentro do mercado de trabalho, longe do sonho

Apesar de estar inserida no mercado de trabalho português, Ana Cristina Correia, licenciada em economia e fiscalidade, relembra que as condições de trabalho no mercado português levam muitos jovens a procurar emprego noutros países “de modo a conseguirem obter mais sucesso, melhores salários e melhores condições de trabalho”.

Marco Campos, 23 anos | fotografia cedida pelo mesmo

Marco Campos que ambiciona a área do jornalismo de investigação, é um exemplo disto e afirma que “neste momento procuro principalmente oportunidades no estrangeiro na minha área.”. Em 2020 foram 6.406 os jovens entre os 15 e os 24 anos que deixaram Portugal em busca de uma oportunidade de estarem um passo mais perto do futuro que desejam. 

Com a dificuldade que arranjar emprego representa, há jovens que acabam por se auxiliar em áreas que não as suas para conseguirem estar inseridos no mercado de trabalho. Diogo Dias, licenciado em ciências da comunicação no ramo de jornalismo, ingressou na área da teleassistência por não querer estar parado. Afirma que “Profissionalmente não me revejo no que estou a fazer, mas em termos pessoais sim. Ajudar idosos que estão sozinhos, ou precisam de mais atenção, é esse lado mais humano acho que continua ligado à área.”. 

Os jovens portugueses procuram cada vez mais formas de estarem conectados com o mercado de trabalho e áreas circundantes, lembrando-os constantemente daquilo que pretendem fazer e funcionando como um incentivo para continuarem.

A vontade de querer

Empreendedorismo é o ato de empreender, fazer algo novo e diferente dentro de um mercado, uma empresa e para a sociedade. No mundo laboral, o termo diz respeito à procura de novas oportunidades através da criatividade e inovação.

Retirado de dicionariofinanceiro.com

Muitos jovens sonham, desde cedo, em abrir a sua própria empresa e trazer algo novo e inovador cá para fora. Mas nem todos seguem esse caminho. Apesar dos apoios disponibilizados quer por Portugal, quer pela União Europeia para promover o empreendedorismo jovem, ainda é algo que se apresenta em crescimento.

“Ninguém equaciona fazer uma casa sem ter um projeto (Feito por um arquiteto, aprovado por um engenheiro civil, e executado por trolhas, eletricistas). Mas na área da produção de eventos, toda a gente “sabe tudo”, e muitas etapas e funções são ultrapassadas.”

Pedro Moreira, 30 anos

Pedro Moreira, soube desde cedo o que queria fazer. Em 2009 fundou a empresa PALMO produções, ainda antes de ingressar no ensino superior onde se licenciou em Som e Imagem e tirou o mestrado em Cinema e Audiovisual. Afirma que trabalhar por conta própria “não foi uma ambição, mas uma necessidade, pois a área do audiovisual era e ainda continua a ser maltratada e considerada na generalidade uma área amadora.” e que a vontade de fazer a diferença na área e acima de tudo “mostrar ao mercado que um miúdo, por muito novo que seja tem capacidade de assegurar trabalhos complexos, que habitualmente só são entregues a quem tem experiência” foi o seu mote para continuar.

Luana Teixeira | Fotografia cedida pela mesma

Também Luana Teixeira, viu no empreendedorismo o reflexo do seu futuro. Licenciou-se em ciências da comunicação e tirou formação em gestão de redes sociais, representação e moda e passerelle. Conta com quase 16 mil seguidores nas redes sociais e a sua marca é ela mesma. Abriu a sua loja online antes de ingressar na faculdade, em 2018, mas foi deixando o projeto em standby até que em 2020 decidiu que “tenho de levar avante algo que me fizesse feliz e me fizesse sentir realizada”. Mudou o nome da loja, pensou o logotipo e todo o branding por detrás da marca e hoje tem aloira store, projeto que adotou o nome pela qual é conhecida no mundo digital. As redes foram a sua maior ajuda aquando do lançamento, mas destaca a pandemia como um entrave que foi ultrapassado e conseguiu “criar uma base de clientes estável e que me permite continuar”.

O empreendedorismo é visto pelos jovens como uma forma de permanecerem livres de tradições e poderem fazer aquilo que se apresenta como o mais correto para eles, ao mesmo tempo que têm toda a carreira pela frente que lhes permite falhar, recomeçar, encontrar o caminho certo e ambicionarem aquilo que desejam para a sua inserção no mundo de trabalho.

O futuro profissional dos jovens portugueses

“Se existisse uma resposta correta, talvez essa viria da premissa “estado da economia nacional”. Hoje, como penso que não consigo dar uma resposta concreta e factual, digo que sim, há lugar para todos no mercado de trabalho.”

Nuno Gonçalves, 21 anos

A relação dos jovens com o mercado de trabalho caracteriza-se, então, como instável. As constantes oscilações financeiras, a inovação que não é aceite em todas as empresas e a falta de oportunidades levam a que exista uma ínfima parte que diga que conseguiu ingressar no mercado de trabalho.

A grandeza do mercado de trabalho, por vezes, coloca entraves. Marco Campos e Maria Morais, ambos da área da comunicação, consideram que não há lugar para todos e que é cada vez mais difícil os jovens conseguirem uma oportunidade pela vasta procura que existe em relação às ofertas disponíveis. 

Teresa Soares destaca a ambivalência do mercado de trabalho e alerta para as oportunidades que podem surgir: “Hoje há áreas profissionais com falta de trabalhadores e há áreas com excesso de trabalhadores. Os jovens devem estar atentos às oportunidades que surgem nas áreas tecnológicas que são as áreas com maior procura.”. 

A idade e sobretudo a experiência mostram-se inimigas daqueles que querem ter um caminho profissional e Bárbara Anjos relembra que “nem todas as pessoas encontram o caminho certo e no qual se enquadram logo numa primeira instância.”

Rita Almeida

Rita Almeida, 21 anos, natural de Vale de Cambra. O gosto por comunicar e querer sempre saber mais surgiu muito cedo, definindo CC como carreira a seguir. Atualmente no terceiro ano do curso, na Universidade Lusófona do Porto, sou, também, colaboradora na editoria “Geração Z” na plataforma #infomedia.