Luís Loureiro: “Entretenimento e jornalismo têm géneses absolutamente distintas.”
- Ana Gomes
- 25/04/2022
- #jornalismofrankenstein Sem categoria
[Por Ana Catarina Gomes e Ana Jorge]
Luís Miguel Loureiro é licenciado em Bioquímica pela Universidade de Coimbra, desde 1992. É, também, doutorado desde 2012 em Ciências da Comunicação, com especialidade em Sociologia da Comunicação e da Informação pela Universidade do Minho. Foi jornalista no canal de televisão RTP durante 24 anos, onde, entre 2015 e 2021, integrou a equipa do programa de jornalismo de investigação “Sexta às 9”. De 2012 até 2021 foi professor na Universidade Lusófona do Porto, onde dirigiu a Licenciatura em Ciências da Comunicação e o Mestrado em Comunicação, Redes e Tecnologia. Para além disso, foi membro do corpo docente dos Doutoramentos em Estudos em Comunicação para o Desenvolvimento e em Arte dos Media. Entre 2008 e 2013 foi investigador do CECS e, entre 2013 e 2021 esteve ligado ao grupo CICANT. Investiga nas áreas das Ciências da Comunicação, Jornalismo, Sociologia dos Media, Redes Digitais, Ativismo e Mobilizações Públicas e Cultura Visual.
Luís Loureiro é um dos convidados da sessão da manhã da VII conferência anual Jornalismo Frankenstein, que irá decorrer na Universidade Lusófona do Porto, no dia 26 de abril de 2022 (10:00-13:30 e 15:00-18:30).
1-O que é para si entretenimento? E o que é para si jornalismo? Há ou deverá haver uma diferença clara na sua perspetiva?
São atividades cujo princípio fundador é totalmente distinto. Vejamos: ambas se relacionam com atividades humanas que têm milénios de existência, decorrentes da intelectualização da vida em comunidade.
O entretenimento vem do modo festivo como o ser humano celebrava o sucesso da sua sobrevivência, quer nos tempos em que era caçador-recoletor, festejando as caçadas em grupo, quer depois, quando passou a celebrar as colheitas agrícolas ou as vitórias em guerras contra inimigos externos. Estas celebrações foram-se ritualizando, com o passar dos séculos e com a fixação humana em comunidades cada vez maiores. A ritualização é também uma forma de estabelecer comunidade.
O jornalismo é a expressão moderna da transmissão de informação, que sempre fez parte das sociedades humanas: o ser humano sempre precisou, por exemplo, de se defender das ameaças, fossem as de tribos rivais ou de predadores. Necessitou, por isso, de formas de transmissão da informação, fosse informação transmitida a longas distâncias, fosse informação de proximidade. Com a fixação geográfica das comunidades humanas, surgiu a política (que vem de “polis”, cidade), tendo-se sempre esta baseado também na troca de informações. O mesmo se aplica, claro, ao comércio, aos mercados de trocas, por exemplo. O jornalismo resulta, assim, deste modo de funcionamento das comunidades humanas.
Em resumo: entretenimento e jornalismo têm géneses absolutamente distintas. O facto de, nos nossos dias, se estarem a (con)fundir uma na outra tem a ver com a forma como o ser humano se passou a relacionar com o tempo livre e com a mercantilização desse tempo livre. Informação e entretenimento passaram a integrar produtos de consumo que passaram a ser vendidos nas mesmas plataformas: os média. Ora, o consumo é assim mesmo: numa mesma refeição tanto podemos comer uma sopa de legumes como, pouco depois, mousse de chocolate. Mas enquanto comemos a sopa porque nos faz bem e é fundamental para a nossa sobrevivência pelos nutrientes que contém, a mousse é comida porque nos sabe bem. Nunca ninguém sobreviveu à base de mousses de chocolate. A questão é que são coisas diferentes que passámos a fazer ao mesmo tempo. É como informarmo-nos e entretermo-nos.
2-Na sua opinião, em que medida existem más práticas jornalísticas que afastam as pessoas da informação e as aproximam do entretenimento?
As más práticas jornalísticas decorrem, precisamente, do facto de o jornalismo ter sido tomado de assalto pelo consumismo desenfreado do nosso tempo. A informação, que devia ser feita por nos fazer bem, a todos, como comunidade, passou a ser feita para ser mais facilmente consumida: adocicou-se, como a mousse de chocolate. E é por isso que a fusão entre informação e entretenimento é potencialmente tóxica.
3-Na sua perspetiva, o facto do jornalismo, por vezes, se “misturar” com o entretenimento não acaba por tirar alguma credibilidade ao verdadeiro ato de jornalismo?
Claro que sim. Só uma pessoa capaz de distinguir a informação bem produzida da informação de pechisbeque é que será capaz de discernir o bom do mau jornalismo. Para todas as outras pessoas, o que acontece é a perda generalizada de credibilidade do jornalismo. Tomam tudo e o seu contrário por jornalismo, o que é errado.
O meu nome é Ana Gomes, tenho 21 anos, e sou natural de Braga. Frequento o 3º ano da Licenciatura de Ciências da Comunicação na Universidade Lusófona do Porto. Escolhi esta Licenciatura porque a área da Comunicação sempre foi algo que me despertou muito interesse.