Mapeamento de Andriivka: “Encontramos esta aldeia, temos esta história”
[Catarina Almeida e Inês Diana Silva]
Catarina Santos é jornalista no Observador e coordenou a equipa que realizou a reportagem sobre Andriivka, uma aldeia ucrâniana que esteve sob ocupação Rússa durante 30 dias. O trabalho do seu grupo foi galardoado com o prémio Gabriel García Marquez e é hoje uma refêrencia nas narrativas transmedia. Catarina, juntamente com os restantes membros da equipa, esteve presente na oitava edição do Jornalismo Frankenstein, ciclo de conferências organizado no âmbito da unidade curricular de Transmedia e Narrativas Híbridas, pelos finalistas de Jornalismo, para falar sobre todo a produção por detrás do mapeamento que fizeram, desde a chegada do tema à redação até à sua publicação no site.
#infomedia: Como é que foi a recetividade das pessoas relativamente à vossa presença nas casas deles e nos antigos abrigos?
Resposta: Tal como o João e o Carlos foram falando um bocadinho, eles encontraram uma aldeia ainda muito em choque, não é? Ela teve só uma ocupação Rússa durante 30 dias, não tinha passado assim tanto tempo quando eles lá chegaram e, portanto, as pessoas ainda estavam, como o Carlos dizia, a tentar arrumar o que podiam, nem que fosse colocar tijolos empilhados.
O que eles notaram e o que nos transmitiram foi que as pessoas queriam muito mostrar, porque elas tinham estado durante 30 dias num sufoco, muitas delas presas numa cave, nem sequer eram um bunker em condições, uma cave onde eles guardavam batatas e alimentos e que tiveram que servir de abrigo.
Estiveram fechados durante muito tempo, só saíam cá fora para procurar água e mesmo assim sabendo que estavam a arriscar a vida e portanto quando os jornalistas começam a chegar à aldeia, as pessoas, depende um pouco, claro que isto não seria à circunstância com todas as pessoas, mas o que eles encontraram, sobretudo nas pessoas que quiseram partilhar as histórias, foi uma necessidade muito grande de que aquelas histórias chegassem ao resto do mundo e portanto havia esta disponibilidade para se exporem e havia muito isto, não é? Por isso é que o João foi sentindo muito até esta coisa de querer, de perceber que tinha que filmar, que não chegava só a fotografia, porque as pessoas estavam mesmo a dizer “Venha, Venha” e a querer contar e fazer uma visita guiada por tudo aquilo que tinha ficado e por tudo aquilo que eram símbolos do sufoco que tinham vivido lá.
#infomedia: E vocês desde o início, quando as histórias chegou à redação do Observador, sempre pensaram em fazer a reportagem neste modelo?
Resposta: Acho que desde o primeiro, acho que me lembro que o diretor do jornal ligou-me no dia 25 de abril a dizer “Temos aqui uma coisa completamente diferente” porque o Carlos e o João estavam já em contato a dizer também “Encontramos esta aldeia, temos esta história” e portanto acho que desde um momento muito inicial…nessa altura eles ainda estavam a começar a ir à aldeia, eles foram várias vezes à aldeia, passaram lá vários dias, percebemos logo que se calhar tínhamos de contar aquilo de uma maneira diferente, acho que não tínhamos, claro, fechado na nossa cabeça desde o início como é que isto se faria porque não sabíamos que tipo de material é que íamos conseguir recolher e como é que íamos conseguir organizar tudo, não é?
E esta ideia do mapa só surgiu muito tempo depois, mas acho que percebemos desde o início que tinha que ser qualquer coisa muito diferente, porque era de facto uma história muito particular e muito simbólica. Nós depois fomos ouvindo várias histórias semelhantes a estas, mas naquele momento, quero recordar que as tropas russas tinham começado a ser expulsas dos arredores das cidades, nos arredores de Kiev ali no fim de março, e portanto ainda estava tudo muito em convulsão e muitas destas histórias ainda se estavam a começar a acontecer ainda se estava a começar a perceber que havia muitas outras Buchas, muitos outros sítios onde tinham acontecido coisas inimagináveis portanto, pronto, acho que também por isso percebemos que tínhamos de, encontrando um sítio tão simbólico, tínhamos de o contar de forma diferente.