Trabalhadores-Estudantes reagem positivamente à pandemia
É indiscutível que a pandemia da COVID-19 veio alterar a ordem natural do mundo.
A incerteza tomou conta de todos os setores e o mercado de trabalho foi um dos que mais ressentiu. Os trabalhadores-estudantes foram afetados academicamente, mas, a nível profissional, conseguiram recuperar e arranjar soluções.
[Terá a Pandemia afetado menos do que esperado os trabalhadores-estudantes? Por Ana Luísa Capelo, Inês Gonçalves e Maria João Pereira]
Em Portugal, segundo o Inquérito às Condições Socioeconómicas dos Estudantes do Ensino Superior em Portugal (2017), apenas 1 em cada 5 estudantes de licenciatura e mestrado possuem um trabalho regular durante o ano letivo, isto corresponde a, aproximadamente 22,3%. Quando comparado com outras médias europeias, como da Suécia ou da Noruega, por exemplo, este é um número diminuto. Tendo em conta que os trabalhadores-estudantes já são poucos, seria de prever que, com a pandemia e os sucessivos confinamentos, este número ainda se tornaria menor. A investigação que o #infomedia levou a cabo durante três meses veio comprovar o oposto, esta tendência não foi tão linear quanto seria inicialmente expectável.
O escalar da COVID-19 ↗ No início considerada por muitos como sendo apenas uma “gripe”, foi em março de 2020 que a COVID-19 foi oficialmente declarada pandemia mundial. Desde aí, em Portugal, registaram-se cerca de 856 740 casos positivos e foram declarados 17 045 óbitos. Mundialmente, cerca de 176 156 580 pessoas foram infetadas e 3 802 957 não resistiram [atualização 16:39, 12 de junho de 2021]. Perante esta conjuntura atípica, por todo o mundo, foram tomadas medidas para impedir a propagação rápida do vírus. |
“Por muito estranho que isto pareça, algumas das regras que começaram a existir devido à pandemia até foram práticas para mim” conta Sabrina Faria, estudante de Design Gráfico na Lisbon School of Design (LSD) do Porto. Recentemente a jovem estudante começou a trabalhar em regime part-time numa loja da marca Levi’s, em Guimarães, porém garante que “se as aulas não fossem por Zoom não conseguiria conciliar tudo, ainda são 55 quilómetros de viagem e não tenho a regalia de escolher o meu horário de trabalho conforme me é mais conveniente”. Apesar de já estar a preparar o seu projeto final de curso ainda tem algumas sessões de tutoria e orientação que considera “extremamente importantes” mas “exequíveis on-line“.
Neste caso em particular, a estudante de design gráfico beneficiou com uma das regras obrigatórias implementadas pela Direção Geral de Sáude (DGS), a obrigatoriedade do ensino à distância nas universidades. Para além de viver em Guimarães, o seu trabalho também é lá, se tivesse a necessidade de se deslocar ao Porto diariamente para assistir às aulas não teria a disponibilidade horária necessária para manter um emprego, ainda que em regime part-time. Assim, consegue gerir melhor o seu tempo e conciliar tudo, “consigo perfeitamente assistir a uma aula e passado 5 minutos estou no trabalho” especifica, “se tivesse de ir até à Boavista [localização da Universidade] demoraria, pelo menos, 40 minutos até estar em Guimarães novamente”.
Sabrina encontrou este trabalho durante a pandemia, depois do término do segundo confinamento. Enquanto que a percentagem de desemprego aumentou em Portugal – segundo o Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP) em abril de 2021, mais de 400 000 pessoas encontravam-se desempregadas -, esta estudante conseguiu arranjar uma oportunidade de entrar no mundo do trabalho. Explica que “já estava cansada de estar tanto tempo fechada em casa” e que a procura de trabalho começou como uma forma de “ocupar a quantidade absurda de tempo livre que tinha”. A verdade é que não teve de pesquisar durante muito tempo, “estava no facebook e apareceu-me um anúncio”, conta, desde logo decidiu agarrar a oportunidade e entregar o seu currículo.
Em contraposição à elevada taxa de desemprego, há a evolução das ofertas de trabalho. Desde abril de 2020 que este valor tem vindo a crescer, atingindo o seu pico, precisamente, passado um ano, em abril de 2021, altura correspondente ao início do Segundo Plano de Desconfinamento Nacional. Torna-se claro que à medida que os vários setores foram voltando à atividade, ainda que tenha sido de forma lenta e progressiva, necessitaram de contratar novos profissionais. Atente-se que, a procura ainda continua a ser mais elevada do que a oferta, porém denota-se uma maior receptividade do mercado a novos trabalhadores. “Tenho noção que é difícil arranjar um emprego durante uma pandemia” declara Sabrina “de uma forma geral sinto que sou uma sortuda por, ainda assim, ter conseguido dar a volta por cima”.
À semelhança da vimaranense, também Nuno Silva, estudante de Gestão e Economia na Universidade Portucalense Infante D. Henrique, continuou a trabalhar durante a pandemia, mas teve a necessidade de se adaptar a esta nova realidade. Nuno trabalhava em estabelecimentos noturnos desde 2018 e em 2019 tinha começado a organizar festas em discotecas, mas, no ano de 2020, foi forçado a rescindir a sua atividade nestes espaços. Garante, porém, que não teve grandes dificuldades em encontrar uma nova fonte de rendimento, “tinha um projeto em mente mas, por questões de tempo, nunca tinha tido a oportunidade de o desenvolver, quando as discotecas fecharam comecei a pensar mais neste possível negócio, que agora já existe”.
Uma percentagem dos trabalhadores-estudantes, antes da COVID-19, trabalhavam no setor do entretenimento noturno, em discotecas e bares. Esta área foi profundamente afetada, uma vez que, desde o início da pandemia, suspenderam atividades e encerraram portas. Os estudantes que exerciam funções nestes locais – como organizadores de eventos, relações públicas, chefes de equipa, bartenders, entre outros – tiveram de arranjar soluções. Ao verificar dados do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP), é possível perceber que a percentagem de pessoas desempregadas com menos de 25 anos é consideravelmente menor do que aqueles que já têm 25 anos ou mais. Vale a pena ressaltar que, desta análise, a esmagadora maioria dos indivíduos considerados buscam um novo trabalho e não é a sua primeira experiência profissional.
É adjacente deste espírito de iniciativa e empreendedorismo que surge a D’Ouro Private Yacht, empresa criada por Nuno em plena pandemia. “Acho que a grande vantagem que nós [jovens] temos é a capacidade de nos conseguirmos adaptar rapidamente” começa por explicar, “e depois ainda há as redes sociais que, para mim, foram tudo, permitiram-me perceber publicitar o meu negócio e, através de estratégias de marketing digital, ter um alcance extraordinário”. Para o jovem tratou-se de analisar o mercado, “tentei perceber o que é que as pessoas queriam, por isso é que disponibilizámos vários serviços, não é apenas um passeio de barco, há muitas componentes incluídas”. Graças a este investimento conseguiu não ser “completamente afetado negativamente a nível profissional”.