Videojogos: uma doença da nova geração
- Matilde Silva
- 06/01/2022
- Geração Z Saúde
Submersos numa realidade virtual que consideram verdadeira, cada vez mais os jovens vivem numa ilusão retratada nos videojogos. Uma realidade que acarreta problemas físicos, psicológicos e cognitivos, a longo prazo, se o consumo não for reduzido.
[Texto por Matilde Silva]
As novas tecnologias caracterizam a geração atual, tendo como uma das principais vertentes os videojogos. Estes tornaram-se uma adição nas vidas dos jovens, servindo como forma de distração e relaxamento da correria do dia a dia. Neste caso em particular, o hobbie pode tornar-se um problema e, mais tarde, uma adição, que acaba por acarretar consequências a longo prazo.
Em 2018, a Organização Mundial da Saúde, OMS, considerou o “distúrbio do jogo” como parte da lista de doenças classificadas como perturbações do foro mental. Apesar dos poucos dados existentes sobre este assunto e de ser ainda preciso bastantes estudos e investigações, este distúrbio aparece, também, na quinta edição do manual “Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders”, DSM-5, como a única adição comportamental, tendo o termo específico “Internet Gaming Disorder”.
Diversas instituições apontam as mesmas consequências no que respeita ao excesso de tempo passado à volta dos videojogos. De acordo com a Instituição Externato Champagnat algumas das consequências evidentes nos jovens dependentes dos videojogos são o aumento de hábitos sedentários, o desenvolvimento de problemas de sociabilização, de problemas posturais e visuais e o insucesso escolar.
Abordando também um artigo da Médis, empresa de seguros de saúde, para além dos problemas previamente abordados pelo Externato Champagnat, este menciona também: errada perceção da realidade, falta de atenção, aumento do estado ansioso, a criação de comportamentos agressivos e pouco empáticos e uma maior irritabilidade e probabilidade de desenvolvimento de problemas emocionais, psicológicos e, até mesmo, cognitivos, tais como a perturbação do sono.
Este tipo de consequências, ao terem a mesma fonte, os videojogos, encontram-se todas interligadas entre si. Um fator comum e agravante destas consequências é o tempo. Quanto mais horas os jovens passam em frente aos ecrãs, seja dos telemóveis, computadores ou televisões, mais alarmantes e preocupantes se tornam os efeitos, principalmente os problemas mais físicos, como a visão, que fica sobrecarregada com as luzes nocivas provenientes dos ecrãs, e os problemas posturais, que mais tarde acarretam complicações na coluna.
Estes jovens ao se sentirem em controlo, nos seus jogos, acabam por criar uma perceção errada da realidade não conseguindo nem querendo distinguir o que é ou não verdade. Deste modo, estes tornam-se menos sociáveis e desenvolvem problemas na criação de ligações e vínculos com outras pessoas, demonstrando uma grande falta de empatia e insensibilidade a tudo e todos que cruzam o seu caminho. Continuando no percurso das alterações comportamentais, ao se depararem sem o seu vício, estes jovens tornam-se, na sua maioria, mais facilmente irritáveis, mesmo nos aspetos mais banais do dia a dia. Tudo isto, de acordo com o artigo realizado pelo Externato Champagnat, pode levar a perturbações psicossociais mais graves como a agressividade, perturbações do sono, depressões e ansiedade. Em casos mais extremos, pode ocorrer o desenvolvimento de uma Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção (PHDA), conforme refere a companhia de seguros Médis.
Gamer, a profissão do futuro
Filipe Dias, jovem portuense de 20 anos, mais conhecido por Nopeejcs, faz sucesso nesta geração pela sua profissão, gamer. Agenciado pela OFFSET, este afirmou-se no cenário nacional de CSGO, tendo ajudado nas vitórias de torneios de gaming, tais como a Master League Portugal ou a OMEN WGR Retake.

Os videojogos são a sua profissão e também o seu sonho realizado, esperando conseguir crescer e fazer uma carreira no mundo do gaming. Apesar de considerar os videojogos um vício na sua vida, tal como na vida de muitos outros, garante conseguir uma boa gestão do seu tempo, algo essencial para não se fazerem sentir as consequências graves. O desporto na sua vida esteve e está sempre presente, afirmando que é bastante importante e essencial na vida de quem passa muito tempo sentado em frente a um ecrã. Apesar de passar diariamente, em média, 5 a 8 horas a jogar, tenta gerir o seu tempo de forma a ter espaço para tudo, família, amigos, desporto e descanso, sendo essa boa gestão o suficiente para que o vício seja o mais saudável possível na sua vida.
Conclusões de inquéritos
As opiniões acerca do tema dividem-se, no entanto, é consensual que existem consequências negativas notórias nos jovens, geradas pelo consumo excessivo de videojogos. Tudo isto foi evidenciado através de um questionário, realizado exclusivamente para este artigo, preenchido por 28 pessoas, com filhos, onde foi demonstrado que 62,1% dos inquiridos consideram que os seus filhos passam, em média, entre uma a duas horas a jogar por dia, sendo que 69% afirmam ter denotado efeitos negativos do uso desses suportes digitais. Os efeitos mais apontados foram a maior irritabilidade, o aumento do estado ansioso, uma maior agressividade, o crescente desinteresse por tudo o resto e dificuldades em socializar. Em termos físicos, mais de metade dos inquiridos apontaram os problemas de postura como uma agravante crescente.

Por outro lado, e de acordo com um inquérito, também realizado no âmbito deste artigo, desta vez, direcionado aos jovens que jogam videojogos, apesar de somente três se terem autointitulado de “viciados”, 69,7% dos 48 inquiridos conseguem identificar malefícios provenientes dos videojogos e da sua constante utilização. Ao parecer dos jovens as maiores consequências são, de um modo geral, as mesmas apontadas pelos pais: maior irritabilidade, a criação de comportamentos agressivos, dificuldades de socialização, e ainda o insucesso escolar.

Dependência dos videojogos como uma doença
O problema do vício dos videojogos tem vindo a aumentar de forma galopante e preocupante. Tanto em termos de mais crianças e adolescentes jogarem, como em termos de horas despendidas neste vício, estas são as maiores preocupações. Um estudo realizado nos Estados Unidos demonstrou que 97% dos adolescentes jogam videojogos e um outro realizado na Irlanda mostrou que, na faixa etária dos 12 aos 14 anos, as crianças despendem, em média, 15 horas semanais só neste tema.
Em Portugal, o número de jovens que apresentam sinais de dependência neste jogos já chega aos 20%, número esse que tem tendência a subir cada vez mais, tornando-se alarmante, visto que uma dependência se torna uma doença, num estado mais avançado.
Contextualização do problema e o seu crescimento
O mundo digital e tecnológico já existia antes da Geração Z, pessoas nascidas entre os anos de 1995 e 2010, sequer ter esta designação. No entanto, foi no pico do crescimento destas novas tecnologias que esta geração nasceu e cresceu, não conhecendo nenhuma outra realidade para além desta. Enquanto que as gerações anteriores, nomeadamente os Millennials, nascidos entre 1980 e 1995, cresceram a brincar na rua, a andar de bicicleta e com constante convivência social com os amigos, a situação dos jovens inseridos na Geração Z já não é bem assim. Estes, de uma forma geral, foram habituados, desde cedo, a tudo que era digital, fossem as suas brincadeiras ver vídeos no Youtube ou jogar nos telemóveis dos pais.
Tendo a sociedade um grande impacto na tomada de decisões das crianças e jovens, estes, a uma dada altura da sua vida, sentem-se pressionados a adotar os hábitos e gostos ditados pela mesma. Desta forma, estes jovens acabam por ceder às inovações tecnológicas características desta geração e todos caem na tentação dos videojogos, fosse momentaneamente ou fosse de um modo mais permanente. Estes dois fatores tempo são cruciais para a criação ou não criação do vício e dependência e para o desenvolvimento e agravamento dos efeitos provenientes dos videojogos.
Matilde Silva, 20 anos, natural de Leça da Palmeira. O gosto por novas línguas, culturas, costumes e leitura fez com que a comunicação surgisse como uma paixão e carreira a seguir. Estudante de terceiro ano em Ciências da Comunicação, na Universidade Lusófona do Porto, e colaboradora na editoria da “Geração Z” na plataforma #infomedia