Vinho do Porto: Uma tradição com três séculos e cada vez mais jovem

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Vinho do Porto: Uma tradição com três séculos e cada vez mais jovem

Nos últimos três anos, o setor do vinho do porto tem crescido anualmente entre 2.5% a 3%. Os indicadores são cada vez mais positivos e a aproximação ao público jovem tem sido um sucesso.

[Reportagem de Guilherme Caroço]

O vinho do Porto é uma cultura com alma e tradição, com características de produção únicas, naquela que foi a primeira região de denominação de origem controlada a ser demarcada no mundo. Os primeiros vestígios de videiras datam de há 3000 anos e a primeira referência documentada sobre o vinho do Porto remonta a 1675. Este vinho acompanhou várias épocas, gerações e costumes, mas afinal como consegue sobreviver e inovar-se ao longo do tempo? 

 Em 2021, o setor terminou o ano com valores recorde, cerca de 607 Milhões de euros. Gilberto Igrejas, presidente do Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto (IVDP) e docente do curso de enologia na Universidade de Trás dos Montes e Alto Douro (UTAD), confessa que “o facto de termos atingido os 607 milhões, dá-nos uma responsabilidade maior, seguramente que não queremos 2022 com menos que 2021”, afirma com convicção.

Já traçado o plano para este ano constata que é necessário “continuar a implementar modelos de responsabilidade, promoção e proteção das denominações de origem protegida (DOP), continuar fortemente a apostar na promoção internacional, a privilegiar os vinhos de categorias premium e os mercados que estão dispostos a pagar o justo preço”, assegura o presidente. Outro aspeto crucial e que está delineado, é aproximar o público jovem do vinho do Porto, “no sentido de que conheça melhor as categorias, os estilos de vinho que nós temos, até porque acreditamos que quando o público mais jovem conhecer melhor o vinho do Porto, seguramente que vai ficar deliciado”, complementa.

“Nós temos que continuar a apostar pelo caminho do valor”

Gilberto Igrejas, Presidente do IVDP

A aproximação ao público jovem está a ser feita através de novas bebidas, “designadamente o Portonic”, explica Gilberto. A criação desta nova bebida veio desmistificar “a complexidade que as pessoas que consomem vinho do Porto julgam ter para o realizar”, a solução passou por criar “uma bebida que já está preparada”. A pessoa chega a “casa, agarra na lata de Portonic, com duas ou três pedras de gelo, uma ou duas folhas de hortelã, uma rodela de limão e dois ou três grãos de café, tem o Portonic pronto a ser servido, é um Ready To Drink”, explica o presidente do IVDP. A aceitação do produto está a ser “fantástica”, mas não fica por aqui, o plano com esta nova bebida é seduzir os jovens consumidores para que fiquem “aliciados em saber que bebida está na génese deste Portonic, com essa descoberta vamos captar mais consumidores para o vinho do Porto”, acrescenta. 

Ana Margarida Morgado | Relações Públicas Taylor´s

Iniciativas como o Certified Port Educator e outros eventos que visam formar profissionais na área do Vinho do Porto, são outro aspeto que tem atraído cada vez mais jovens. Gilberto relata que é “notório que aqueles que vêm fazer os cursos são cada vez mais jovens

Além fronteiras, como é o caso do evento Master Of Port que se realiza em França, é “extremamente gratificante relembrar que aqueles que foram ao evento eram jovens, mesmo muito jovens, com um conhecimento enorme, uma bagagem de lastro da Região Demarcada do Douro e também dos vinhos”, declara.

Adaptação do mercado à pandemia 

Com o término do ano de 2021 com valores históricos de comercialização, teve de existir um processo de adaptação desde o início da pandemia. O docente de enologia caracteriza o feito como “muito importante para a Região Demarcada do Douro” tendo em “consideração que estávamos num ano de pandemia e tendo por base que 2020 tinha sido um ano de retrocesso.” O ano de 2019 mostrou-se muito positivo. “Depois de oito anos consecutivos a baixar a comercialização, 2019 marcou um ponto de inflexão da curva”, indica o presidente do IVDP, realçando que o mercado cresceu cerca de “2% em termos de valor”, o início da pandemia “veio trazer muita incerteza aos mercados”.

Houve setores da atividade económica que foram mais prejudicados que nós

Gilberto Igrejas | Presidente do IVDP

Os primeiros seis meses do ano 2020 foram menos bem sucedidos, já o segundo semestre foi melhor, mas “não permitiu recuperar as quebras que tínhamos tido no primeiro semestre”, complementa o presidente do IVDP, doutorado em Genética e Biotecnologia. Assim sendo, o ano de 2020 terminou com uma quebra global de 9%, incluindo os vinhos do Porto e Douro, de cerca de “50 Milhões de euros”. A reviravolta histórica dada no ano seguinte foi conseguida através da adaptação e implementação de “novos canais de comercialização, ações de promoção e proteção”. Todas as tranches do mercado cresceram tirando uma, “ao nível do vinho do porto no mercado nacional”, Gilberto Igrejas explica que isto evidencia que “não é sobretudo o público português que bebe vinho do Porto, é sobretudo o público turista que visita Portugal”. 

Se tivéssemos tido a comparticipação dos turistas no nosso país, teríamos superado largamente os 607 milhões de euros”

Gilberto Igrejas | Presidente do IVDP
Fonte: Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto (IVDP)
Top-5 de mercados do vinho do Porto:
1- França em primeiro lugar (24.3%)
2- Portugal (15.3%)
3- Reino Unido (12%)
4- Holanda (11.7%)
5- Bélgica (10.9%).

Apesar de França e Portugal ocuparem lugares acima do Reino Unido, este último é o mercado que ocupa a primeira posição em termos de exportação de vinhos do Porto de categorias especiais, em segundo os Estados Unidos da América, em terceiro Portugal, em quarto França e em quinto lugar Dinamarca.
Fonte: Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto (IVDP)

“Nós para sobreviver temos de estar sempre a inovar e de nos reinventarmos, porque senão já cá não estávamos”

De frente para a estação ferroviária de General Torres, do lado direito da estrada segue-se a direito. Passa-se pelo The Yeatman Hotel e desce-se a Rua do Choupelo. Se se calcorrear a rua toda passa-se pelo World Of Wine (WOW) e a Rua D. Afonso III que irá ter ao Cais de Gaia. São cerca de 15 minutos de caminhada. O destino encontra-se acima do WOW, é no nº250 que se encontra Ana Margarida Morgado. São 10h45. Nélson é o segurança que está de serviço na portaria das caves da Taylor´s e está a dar indicações a alguns turistas britânicos. 

É na sala de provas que está Ana Margarida Morgado, atual relações-públicas da Taylor´s e licenciada em Engenharia Alimentar. Quando terminou a licenciatura não tinha a certeza qual seria o próximo passo, decidiu ir para “França fazer um mestrado em Marketing e Economia no setor dos vinhos, águas ardentes e bebidas espirituosas”, um mestrado da Organização Internacional da Vinha e do Vinho (OIV). A paixão pelo Vinho do Porto começou nesse exato momento, “fez com que visitasse muitas regiões vitivinícolas pelo mundo inteiro, uma das regiões foi o Douro e apaixonei-me”. Começou por trabalhar no IVDP, onde esteve quase seis anos e no ano 2000 mudou-se “para o outro lado do Rio Douro”. “Comecei a trabalhar na Taylor´s, já lá vão 22 anos e é uma paixão muito grande”, relembra Ana com emoção.

O Vinho do Porto é único, tem uma região única e existe uma grande responsabilidade

Ana Margarida Morgado | Relações Públicas da Taylor´s

A preocupação em atrair os jovens e novos consumidores para o Vinho do Porto “não é de agora”. Para o mercado não é novidade a constante evolução e produção de novos produtos, até porque as mudanças ao longo dos séculos assim obrigaram, em muitos momentos “ou era sucesso ou morte”, complementa Ana. 

Uma das adaptações mais recentes é a formação de uma equipa em Marketing Digital, algo que a Taylor´s está a “dar os primeiros passos”. Para Ana Morgado é essencial apostar nestes novos meios comunicacionais porque “a empresa é cada vez maior”. Não têm só o Vinho do Porto. “Temos os hotéis e o World Of Wine (WOW) e tudo se junta para a promoção do Vinho do Porto e sobretudo pela experiência de Porto e Douro”, acrescenta. O turismo associado ao Vinho do Porto e espaços como o WOW ou a Enoteca 17.56 são importantes para a divulgação e captação de novos consumidores, algo que o presidente do IVDP constata que “o facto de todos estes espaços estarem associados à comercialização dos vinhos do Douro e Porto é uma garantia de êxito”.

Em comparação a outros mercados de bebidas alcoólicas, o Vinho do Porto “é um vinho que custa muito a produzir e tem pouca margem para publicidade”, refere Ana Margarida Morgado. Com um “budget” apertado para a promoção dos produtos, o dinheiro existente é aplicado em provas e eventos, a Relações-Públicas da Taylor´s constata que o caminho não é feito através de “grandes publicidades”, mas “pela via educacional”.

Na última edição do Portugal Fashion Week, a Taylor´s marcou presença e o Chip Dry & Tónico (Portonic) teve a oportunidade de se dar a conhecer, outra iniciativa promocional feita no último ano foi o lançamento do Taylor´s Kingsman Edition, uma edição exclusiva para comemorar a trilogia do filme Kingsman “a ideia surgiu do produtor do filme em conjunto com o nosso diretor (…) essa é uma das formas de chegar a alguns consumidores”, finaliza Ana.

“Para chegar aos mais jovens é preciso muito dinheiro, muitas ações, algo que os vinhos do Porto não têm”

Ana Margarida Morgado | Relações Públicas da Taylor´s

“O vinho do Porto está vivo e recomenda-se”

São estas as palavras de Ana Margarida Morgado para descrever a evolução do mercado dos vinhos do Porto “nos últimos 25/30 anos”.  Em termos de notoriedade e valorização da Região Demarcada do Douro, a mudança dos últimos anos é extremamente positiva “há 30 anos, nas linhas de venda, 70% correspondiam a vinhos correntes e 30% de categorias especiais. Hoje estamos a falar de 50/50, isto é uma grande revolução”, refere Ana. Os mercados dos vinhos correntes, como França, Portugal e Bélgica “estão a colapsar nos últimos trinta anos”, já os vinhos de categoria especial “estão a crescer, só não crescem tanto como os outros decrescem”, complementa. Ainda assim, Gilberto Igrejas, presidente do IVDP, garante que “nós temos ainda todos os estilos e categorias envolvidas e seguramente termos sempre um vinho do Porto adaptado à carteira do consumidor”.

“Não podemos de nenhuma maneira ter um vinho de elite em que não existe uma democratização do próprio acesso ao vinho do Porto”

Gilberto Igrejas | Presidente do IVDP

A democratização do vinho do Porto em nada invalida a contínua aposta nos vinhos de categorias especiais, vinhos esses que se pautam pela “notoriedade e diferenciação”.  Para Gilberto Igrejas “o vinho do Porto ao nível do reconhecimento internacional, deve aproveitar essa notoriedade, para que essa notoriedade possa ser associada à qualidade que o vinho do Porto tem”.

Ana Margarida Morgado | Relações Públicas da Taylor´s

As mudanças do mercado ao longo do tempo

Questionada sobre as inovações e adaptações ao mercado, Ana Margarida Morgado relembra que temos de voltar ao “pós- segunda guerra mundial”. Nessa época, o grande mercado para exportação do vinho do Porto era Inglaterra, um mercado que “começa a desmoronar” devido a uma grande crise económica e da alteração do tipo de vida. 

Começa a emergir uma classe média que “tem algum dinheiro e começa a querer comer, beber e vestir melhor”, o mercado habitual das “grandes famílias, dos restaurantes com caves imensas” começou a colapsar. 

Nos anos 60, princípio dos anos 70 a “Taylor´s tem rapidamente de se reinventar, porque não consegue sobreviver só a vender vinhos vintage”, em 1970 é lançado o Late Bottled Vintage (LBV) de 1965, com cinco anos de envelhecimento. Torna-se num vinho do Porto “que veio revolucionar o mercado, é um vinho com grande qualidade, mas muito acessível. É tudo aquilo que o consumidor na altura queria e é um boom”, finaliza Ana. 

Ana Dias | Responsável pela gestão museológica do Museu da 1º Demarcação

” Não é por causa da minha bolsa, maior ou mais pequena, que eu não posso aceder a um grande vinho do Porto”

Ana Margarida Morgado | Relações Públicas da Taylor´s

Pouco antes de ser lançado o LBV, em 1958, foi lançado o Single Quinta Vintage, “no fundo é um segundo vintage”, complementa Ana. Nos anos 50 existem várias mudanças no mercado e “a Taylor´s começa a ver que existem anos que [as colheitas] não são excecionais para produzir vintage, mas são muito boas, era uma pena não engarrafar”. Ana denomina este processo como a “democratização do vintage”, no fundo “é a possibilidade de uma pessoa com menos dinheiro que gosta de provar vinhos do Porto excecionais, consegue aceder a um produto muito próximo de um vintage”.

Ana Margarida Morgado | Relações Públicas da Taylor´s

Na análise da responsável de relações-públicas da Taylor´s, deve ser feita uma constante averiguação de novos consumidores e nichos de mercado. Neste sentido, relembrou três inovações que foram “grandes desafios”, que “rejuvenescem” a imagem do vinho do Porto e contribuíram para um público mais abrangente.

 Em 2008 a Taylor´s juntamente com as empresas “irmãs” a Fonseca, Croft e Crown, lançam pela primeira vez um vinho do Porto rosé, o “Croft Pink”. Ana Margarida Morgado recorda que na altura “havia a moda do vinho rosé a nível mundial”, o desafio foi lançado e o vinho foi apresentado “no Dia dos Namorados, 14 de Fevereiro de 2008”. O processo teve “desafios técnicos altíssimos. No Douro temos uvas brancas, mas para o rosé tem que ser com uvas tintas. As uvas tintas do Douro estão cheias de cor, são retintas, fazer um rosé com uvas de muita cor não é fácil”, explica.

Por conseguinte, em 2010 é lançado o Taylor´s Scion, “lançamos pela primeira vez um vinho do Porto pré-filoxérico [período anterior à chegada da praga filoxera ao Douro] um vinho do Porto de 1885”, refere Ana Morgado com entusiasmo. O preço anexado ao produto foi também um passo importante para a notoriedade do vinho do Porto, pois “pela primeira vez [surge] um vinho do Porto a 3500€ a garrafa”. 

Para concluir, a RP da Taylor´s refere outra inovação que caracteriza como “um grande sucesso”. O Tawny de 50 anos saiu no Diário da República este ano, em Janeiro de 2022, no entanto o produto começa a ser idealizado em 2013. Historicamente o vinho do Porto Tawny tinha 10, 20, 30 e 40 anos, “mas não havia um vinho do Porto com 50 anos, estávamos a perder um nicho do mercado”.  Ana Margarida Morgado afirma que o “vinho do Porto é muito escolhido para festas de 50 anos, bodas de ouro, aniversários, aniversários de empresas. O vinho do Porto é um vinho que está à altura para estas celebrações”.

Reconstrução histórica da Região Demarcada do Douro: “O vinho do alto Douro vinhateiro teve que se reinventar ao longo das épocas”

Com vista privilegiada para o rio Douro, caminhando pela zona pedonal até à Rua de Serpa Pinto nº44B, está o Museu da 1º Demarcação da Real Companhia Velha. Ana Dias, “licenciada em Arqueologia na Universidade do Porto” e com “mestrado em História com especialização em Museologia, na Universidade de Coimbra”, é a responsável pela gestão museológica do museu. Natural de “Massarelos”, informa que o “primeiro contacto direto com a história da Região Demarcada do Douro e com a história da Real Companhia Velha”, surgiu de um convite da empresa secular de vinhos do Porto, para realizar “uma pesquisa iconográfica para uma exposição”.

Para reconstruir a história do alto Douro vinhateiro e verificar o momento primordial da produção vinícola na região, é necessário voltar à civilização romana. Efetivamente, apesar da produção vinícola romana “não ter sido nos moldes atuais, nem nos moldes do século XVIII”, Ana Dias admite que a presença do povo romano deixou várias “estações arqueológicas, lagares vinícolas e espaços destinados à produção vinícola”. A responsável pela gestão museológica do museu da 1º Demarcação, declara que uma das principais estações arqueológicas romanas datam “século III e IV a.c, é a estação de Fonte do Milho, em Canelas na Régua”.

Na idade média nos séculos “XII, XIII e XIV”, as ordens religiosas também produziram vinho na região do alto Douro, nomeadamente “a ordem de Cister”, conclui Ana. O vinho produzido pelos mosteiros perdeu muito espaço com o aparecimento do vinho do Porto no século XVII, “esse vinho deixou de ter grande relevância para os ingleses. Os ingleses queriam era o vinho do Porto, vinho de alta qualidade”, afirma.

As três demarcações da Região Demarcada do Douro

A demarcação da região do Douro foi um processo evolutivo, alvo de muitas retificações e alargamentos “ao longo de 200 anos de história da região”, complementa Ana. Esta foi a principal obra levada a cabo pela Real Companhia Velha, fundada a 10 de Setembro de 1756, com o objetivo de “regular e controlar a produção e exportação do vinho do Porto e do Alto Douro”.

” Esta foi a primeira demarcação de uma zona de denominação de origem controlada no mundo”

Ana Dias | Real Companhia Velha
Fonte: Museu do Douro

A 1º demarcação, conhecida como a demarcação pombalina, ocorreu entre 1756 e 1761. Nesta primeira fase “foram colocados cerca de 335 marcos de feitoria que delimitavam a zona de produção de vinhos de carregação, vinhos de elevada qualidade que não se podiam misturar com vinhos de pior qualidade produzidos nas regiões circundantes”, afirma a licenciada em Arqueologia. A demarcação pombalina em termos geográficos “vai até aos limites do vale do Rio Pinhão e circunscreve-se nessa zona muito especifica”.

Entre a 1º e 2º demarcação, em 1768, é alargada a zona de demarcação aos vinhos de rama para garantir que não existissem misturas entre os vinhos de pior qualidade com os vinhos de primeira categoria. Ana Dias relembra que “uma das grandes metas da empresa [Real Companhia Velha] foi definir as qualidades dos vinhos do Porto. A companhia definiu os vinhos de qualidade e as zonas onde se podia produzir. Os vinhos de segunda qualidade eram os vinhos de rama, vinhos de inferior categoria que ficavam na cidade do Porto para comércio local”.

Fonte: Museu do Douro

A 2º demarcação da região do Douro foi efetuada entre 1788 e 1793 e estendeu-se até ao Vale de Ribalonga, próximo do cachão da valeira. A navegabilidade do Rio Douro ficava comprometida com o cachão da valeira, um afloramento rochoso que acaba por ser completamente demolido em 1792 e assinala um dos grandes feitos da 2º demarcação.

Fonte: Museu do Douro

É no início do século XX, entre 1907 e 1908 que acontece a 3º demarcação, algo “muito semelhante em termos de expansão, em termos territoriais ao que existe atualmente”, confere Ana Dias. Em termos geográficos esta demarcação atinge a fronteira com Espanha, uma necessidade expansiva alicerçada à praga de filoxera e ao aumento da comercialização do vinho do Douro e Porto. A praga de filoxera “trouxe uma necessidade muito grande para reorganizar o território, grande parte das zonas de produção vinícola ficaram extremamente afetadas e nunca mais voltaram a ser replantadas e foi necessário expandir para o Douro Superior”, completa a natural de Massarelos.

Impacto socioeconômico na região do Douro e Porto com a dinamização comercial do vinho do Porto

Toda a dinamização mercantil no Alto Douro vinhateiro influenciou a criação de diversas infraestruturas, muitas delas construídas pela Real Companhia Velha. Foram levadas a cabo várias obras como “acessos terrestres, estradas, pontes, fábricas, tanoarias e muitos outros instrumentos que permitiram o desenvolvimento da região”, explica a arqueóloga. A própria navegabilidade do rio foi um marco importante feito pela Real Companhia Velha, o que permitiu uma fluidez mercantil que não existia devido ao cachão da valeira.

A zona do Douro “era bastante pobre, as pessoas passavam várias dificuldades” e a necessidade sentida na região culminou em “bastantes revoltas e motins porque as crises agrícolas e econômicas influenciaram e impactaram de grande maneira a região do Douro”, recorda a responsável pela gestão museológica do museu da 1º Demarcação. Não obstante a isso, sem o “caráter fiscalizador e controlador da Real Companhia Velha” a região não tinha evoluído e sido alvo de novas infraestruturas.

Na cidade do Porto a dinamização comercial implementada pela Real Companhia Velha resultou na criação de diversas infraestruturas, estabelecimentos de ensino, casas de apoio e estaleiros.

Ana Dias | Responsável pela gestão museológica do Museu da 1º Demarcação

Perspetivação do mercado para os próximos anos

Já com o olhar posto no segundo semestre de 2022, Gilberto Igrejas anuncia que os principais planos do IVDP estão assentes na “promoção nacional e internacional, por forma a rejuvenescer e a reativar os canais que durante os dois anos de pandemia ficaram de alguma maneira mais apagados”. Os planos de inovação e investigação em curso são também alvo de grande aposta e tudo isto “vai ser relevante para determinar o futuro da Região Demarcada do Douro”, finaliza.

Para os anos seguintes o caminho da notoriedade é um ponto fulcral para todo o setor, Ana Margarida Morgado afirma que “faltam mais empresas completamente dedicadas na produção de vinho do Porto de qualidade” e “completamente dedicadas à promoção do vinho do Porto no mundo inteiro”, isso irá permitir dar o “passo seguinte”. Para o presidente do IVDP a questão básica não é saber se “vendemos mais 10 milhões de garrafas, mas se trouxemos mais 10 milhões de euros”. O foco não é quantidade, é a“ diferenciação e afirmação pela qualidade e valorização do produto”. 

A sustentabilidade de toda a fileira do setor é igualmente importante para o IVDP, desde o “agente económico que faz a comercialização” até aos “viticultores”. Para evitar que haja desertificação no Alto Douro vinhateiro “onde há práticas seculares de trabalho, que tem dificuldades de mão de obra”, Gilberto Igrejas constata que “importa remunerar condoidamente”. No fundo existe “uma tria que importa continuar a alimentar”, por um lado o Alto Douro vinhateiro “como património da UNESCO”, assegurar o rendimento “a muitos que lá trabalham e vivem” e acresce a tudo isto “uma dinâmica internacional de enoturismo que traz valor ao país”.

Em breve estará totalmente operacional a ferramenta IVDP Data+, uma “inteligência artificial que provém de algoritmos matemáticos, baseados em dados acumulados durante décadas sistemáticas de trabalho na Região Demarcada do Douro”, afirma Gilberto. A inovação tecnológica vai permitir fazer toda a trajetória “desde a uva até ao copo”, saber a quantidade de uvas disponíveis numa dada parcela da Região Demarcada do Douro, a quantidade em litros que as uvas vão gerar, para onde foi o vinho, por quantas garrafas e como se distribui no mercado.

”Não excluímos ninguém e todos estão ON” 

Gilberto Igrejas | Presidente do IVDP

A formulação dos modelos preditivos desenhados pela ferramenta, vai “ajudar na tomada de decisão aos agentes económicos”, em face da evolução de um determinado ano agrícola. Os viticultores também terão acesso à ferramenta. Aqueles com menos “capacitação digital” terão ao dispor nos municípios “gabinetes de aconselhamento”, este protocolo de proximidade entre o IVDP e os municípios vai “evitar a pegada de carbono, ao nível da deslocação com meios de transporte, do concelho de onde o viticultor é oriundo até à sede do IVDP”. O IVDP Data+ será uma ferramenta que “dará cartas” e ajudará todo o processo de dinamização do mercado.

Guilherme Caroço

Guilherme Caroço, 21 anos. Sou colaborador na editoria de saúde na plataforma #Infomedia.