Webdocumentário “Os Malmequeres de Noêda”
- Admin
- 20/06/2022
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O novo webdocumentário “Associação Recreativa Os Malmequeres de Noêda” (2022) junta 15 testemunhos que resgatam a memória desta coletividade, atualmente localizada no n.º 17 da Travessa de Miraflor, em Campanhã, no Porto. Da história do associativismo, ao relato de quem viveu este movimento, eis o diálogo contemporâneo numa parceria com o MIRA FORUM.
A Associação Recreativa Os Malmequeres de Noêda ao longo do tempo
Um passado e um presente. 70 anos cheios de memórias e vivências que perduram no tempo.
Filipe Lourenço e Mário Gonçalves: Viver para a Coletividade
[Por Mariana Venâncio e Guilherme Caroço]
Duas histórias que se unem numa só voz. Filipe Lourenço, 42 anos, é o atual presidente da Associação Recreativa Os Malmequeres de Noêda (ARMN), fundada a 25 de julho de 1952. Cresceu em Campanhã e ainda hoje vive na casa que guarda as melhores memórias do seu pai Serafim Machado. O pai fazia parte da direção e Filipe acompanhava-o para todo o lado. Este foi o laço que o uniu à coletividade. Aos nove anos perdeu o pai, o que fez com que se afastasse da associação durante vários anos. No futebol encontrou um refúgio. Um sonho que ficou pelo caminho devido a lesões. Ao som de um “tique taque” da vida, o “ponteiro” estagnou e o presidente sentiu-se “perdido”.
Durante 11 anos esteve na Alemanha e depois na Suíça. Regressou em definitivo para Portugal em 2019. Ao ver uma foto do pai na associação despertou-lhe o interesse em ser presidente e assumiu as rédeas.
Dos 283 sócios, Mário Gonçalves é um deles. Com 68 anos, está reformado de uma vida cheia de atividade ao redor de Noêda, local onde nasceu e viveu. Estudou e trabalhou pela zona. Desde pequeno tinha uma relação com a coletividade. O avô, Arnaldo Martins Monteiro, foi o fundador. Aos 20 anos vai para a tropa e aos 22 integra o quadro administrativo. Foi presidente durante nove anos. O seu legado marcou-se pelas obras. Transformou o espaço naquilo que é hoje. Relata os tempos de ouro da associação como “bonitos e exuberantes”. Realça a tristeza de ver algo que outrora era grandioso e hoje está a morrer.
Um passado e um presente que se unem num elo de 70 anos. As dificuldades que a associação, atualmente, está a passar não é algo de agora. Desde há uns anos que a associação enfrenta uma tarefa difícil de sobrevivência.
José Armando: “Ainda bem que existe quem abra a porta dos Malmequeres todos os dias”
[Por Inês Lopes Costa, Rita Almeida e Tiago Oliveira]
José Armando, 72 anos, natural de Campanhã, nem sempre foi presença assídua na Associação Recreativa Os Malmequeres de Noêda. Enquanto jovem, foi internato no seminário dos meninos desamparados, atual Centro Juvenil de Campanhã. Aos 11 anos, após concluir a quarta classe, foi trabalhar para Gondomar, onde exercia funções de lavrador, tasqueiro, merceeiro e ourives. Aos 13 anos, ingressou nas artes gráficas onde era técnico de guilhotina. Aos 21 anos, passou pela denominada Guerra do Ultramar, destacado em Monte Pulhas, Moçambique. Quando regressou, no final de 1975, retornou às Artes Gráficas, no mesmo local onde trabalhava antes, perfazendo um total de 45 anos de serviço na mesma casa. Em 1984, foi abordado pela primeira vez para fazer parte de Os Malmequeres de Noêda, ingressando como Vogal, posição em que se manteve até 1986, quando passou a vice-presidente. Contrariamente a muitos dos relatos que escutamos, o de José Armando sobre a associação é negativo, servindo a imagem que tinha de incentivo para se juntar à associação e querer fazer a diferença lá dentro. Em 1987, deixou a direção para se juntar às Cruzadas de Bem Fazer de Campanhã, a convite de um tio. Foi aqui que esteve até 2016, quando as cruzadas terminaram. Considera-se um benfeitor de Campanhã.
Em 2016 entrou como confrade para a Capela Senhora da Saúde, no Bonfim. Atualmente ainda integra a confraria e faz “um ano em julho” que passa lá as suas tardes, de segunda à sexta, a ajudar nas obras.
“VÍDEO INDISPONÍVEL”
Artur Costa: “Eu conhecia os meus vizinhos de ponta a ponta. Hoje tenho 85 anos e a maior parte dos moradores de Miraflor eu não conheço.”
[Por Diana Morais Ferreira e Henrique Silva]
Artur Costa viveu toda a sua vida em Campanhã, na rua de Miraflor. Tem 85 anos e, entre muitas histórias, lá partilhou a sua paixão pelo teatro.
Cresceu entre Miraflor, lugar onde nasceu e de onde eram naturais os familiares paternos, e Noêda, onde residia a família da parte da mãe. Artur é viúvo há 20 anos, foi em Miraflor que conheceu a sua falecida esposa e foi também aí que construíram uma família. Tem dois filhos, cinco netos e quatro bisnetos, e é na família que encontra a felicidade.
Artur tem o 4º ano de escolaridade, realizado em 1946 na Rua de Pinto Bessa. Depois de sair da escola foi logo para o mercado de trabalho. Numa época em que a miséria era muita, ter os filhos a trabalhar era a preocupação dos pais. Trabalhou durante quase 30 anos num armazém de produtos alimentares, um trabalho duro que deixou muitas marcas físicas.
Foi com os Malmequeres de Noêda que conheceu o teatro e que se apaixonou. Após algum tempo, assumiu essa secção, e conta com orgulho que durante cerca de 30 anos levaram o teatro a vários lugares da zona norte. Entre as muitas peças de teatro que realizou, existiram duas, em particular, que o marcaram: “As Duas Causas” e “Quando o Mar Galgou a Terra”.
Conhece Campanhã como as suas mãos, vive numa ilha quase há 60 anos, e diz que o ambiente e as modificações pelas quais a zona passou, são os principais motivos do seu orgulho.
Artur revela que sente saudades da mocidade e das pessoas com quem a viveu. Já perdeu o contacto com a maioria delas e já lá vão os tempos em que conhecia os seus vizinhos de uma ponta a outra, hoje a maior parte deles estão lá apenas de passagem.
Artur Costa: “Nem sei se é a primeira ou a segunda família, porque eu dediquei-me de alma e coração aos Malmequeres”
[Por Inês Santos e Gonçalo Azevedo]
Artur Costa tem 85 anos e é atualmente o sócio mais antigo da Associação Recreativa Os Malmequeres de Noêda. Numa conversa com tempo, Artur recordou alguns momentos dessa coletividade. Falou quer sobre as dificuldades, quer sobre as memórias e as experiências.
Cresceu e viveu sempre na zona de Campanhã, na rua de Miraflor, e de lá não pretende sair. Foi presidente da associação em 1987. Não sabe dizer se a Associação Recreativa era “a sua primeira ou segunda família”, uma vez que dedicou grande parte do seu tempo ao grupo associativo.
Como um frequentador assíduo que era da associação, considera que a coletividade ajudou muita gente, no sentido em que as educou. Artur inclui-se nesse legado. Relembra o “arcabouço” que os Malmequeres lhe deu, nomeadamente o teatro do qual fazia parte. Ainda hoje se lembra das falas de uma das peças que mais o marcou, chamada “Pouca vergonha”. O teatro cessou em 2003 e, nesse mesmo ano, Artur também deixou de ter funções na associação.
Atualmente, o octogenário já não frequenta com tanta regularidade Os Malmequeres, mas reserva as tardes do fim-de-semana para jogar às cartas com alguns dos seus amigos. Numa conversa mais pessoal revelou ainda vários episódios de confrontos na associação.
A Associação Recreativa foi fundada a 25 de julho de 1952 por Arnaldo Martins Monteiro, que reuniu rapazes e raparigas da zona com o objetivo de fazerem o São João de Noêda. O grupo associativo andava de “porta em porta, de taberna em taberna” sem ter uma sede fixa.
Ilda Alves: “Não há lugar como este. Digam o que disserem, Campanhã é Campanhã”
[Por Ruben Marques e Vitória Costa]
Ilda Alves, de 70 anos, chegou a ser presença assídua na Associação Recreativa Os Malmequeres de Noêda. Com dois dias de vida, a ex-empregada fabril, foi trazida para casa dos pais, na Rua de Miraflor, onde tem passado a maior parte da vida. Estudou na escola da Lomba, na rua Frei Heitor Pinto, e lembra-se de, quando era mais nova, brincar na rua, descalça, de descer e subir a rua a correr, jogar à patela, a sameira, a bola e outras coisas mais.
Quando casou foi morar para Avintes no município de Vila Nova de Gaia. Dos cinco anos de arrendamento da casa, poucas vezes lá ia porque os pais moravam em Miraflor, trabalhava na rua de Pinto Bessa, o marido trabalhava na Avenida Rodrigues de Freitas e como trabalhavam aqui, era muito difícil pagarem transportes para Avintes. A solução que arranjaram foi ficarem a morar na casa dos pais de Ilda Alves, até que, entretanto, o marido foi cumprir serviço militar. Mas, quando ele foi para a tropa já tinham uma filha. Depois de 18 meses de tropa, o marido esteve em Moçambique durante 22 meses e a portuense ficou com a filha em casa dos pais. Quando regressa, em outubro de 1974, voltaram para Avintes, mas por pouco tempo. Em março de 1975 a mãe de Ilda faleceu, o que fez com que tenham vindo morar para a Rua de Miraflor, onde se encontram até aos dias de hoje.
Conta que conheceu a Associação por intermédio da mãe do cunhado, Artur Costa, a senhora Emilinha Calceira, com quem começou a frequentar os ensaios. A partir daqui foi-se incluindo nos Malmequeres, onde fez parte de atividades como o teatro e o folclore. A regularidade com que marcava presença no espaço permitiu-lhe criar memórias e vínculos de amizade com muitas pessoas.
Refere que a rua que habita sofreu transformações ao longo do tempo. Por exemplo, no correr da rua onde é o Espaço Mira, antigamente eram armazéns e o dormitório dos ferroviários que vinham da estação de Campanhã. A respeito deste facto, conta que, quando eles vinham da estação, estava na janela dos Malmequeres, a cantar, e que eles em vez de seguirem para o dormitório, subiam as escadas da Associação para se juntarem à festa que a ex-trabalhadora fabril fazia. Refere que “aquilo lá dentro era uma família, um amor. Agora não sei como é porque eu não frequento.”
José Miguel: “A Memória mais antiga que eu tenho dos Malmequeres é ligado ao rancho, é a primeira memória que me vem à cabeça.”
[Por Ana Gomes e Ana Jorge]
Paulo Ribeiro é presidente da Junta de Freguesia de Campanhã, no Porto. Durante uma conversa, falou-nos sobre a importância do associativismo para a região. Contou, ainda, como são feitos os apoios a este tipo de associações recreativas e que, num futuro próximo, será lançado um novo concurso público, em parceria com a Câmara Municipal do Porto, de modo a apoiarem novas ideias e novos projetos, para Campanhã.
José Miguel é vogal do desporto e do associativismo da Junta de Freguesia de Campanhã. Também durante uma conversa, o vogal falou sobre a memória que tem ligada à Associação Recreativa Malmequeres de Noêda – o rancho. Contou-nos, ainda, que é essa memória que o faz manter o protocolo de apoio à associação, em que a junta apoia as deslocações para espetáculos, de um grupo de dança composto por 35 crianças, com um valor global anual de 450 euros. Na opinião de José Miguel, a associação recreativa é importante para a região, uma vez que ajuda a preservar a diversidade e o património cultural na freguesia.
Campanhã: uma viagem ao presente, ao passado e ao futuro
[por Ana Sousa]
O presente, o passado e o futuro desta freguesia. Começamos esta viagem com o presente em que falamos com o Presidente da Junta de Freguesia de Campanhã e com três moradores da região.
Continuamos a viagem e vamos até ao passado, para perceber as origens de onde tudo começou.
Já o futuro desta freguesia está muito ligado ao Terminal Intermodal de Campanhã. Será que estão todos de acordo com toda esta inovação?
José Luís: “Isto é uma coletividade que tem condições para passar aqui um bocadinho de tempo, há muita camaradagem.”
[Por José Jesus e Fábio Andrade]
Aos 73 anos, José Luís começou a frequentar a associação há relativamente pouco tempo. Não é associado e foi isso que suscitou interesse nesta história. Fá-lo para jogar bilhar com os amigos como forma de entretenimento. Durante uma conversa na associação, tentamos explorar a ligação de José aos Malmequeres de Noêda.
José Luís vive na rua da estação de Campanhã, não é sócio, mas reconhece que tem intenção de o ser. Frequenta diariamente o espaço entre as 14h30h e as 16h, somente para jogar snooker, para passar o tempo e para conviver com os amigos, amizades essas surgidas após a pandemia aquando da sua frequência na associação. Tendo assim poucas histórias e memórias relevantes que lhe tenham marcado. Ao longo da reportagem surgirão também relatos de Raúl Lopes, o qual frequenta a associação desde os 15 anos. Uma outra história relacionada à associação, porém, completamente distinta e que será a ponte entre o passado e o futuro da associação.
A raiz dos malmequeres: histórias contemporâneas da zona inicial da Associação
[Por Diogo de Sousa e Diana Loureiro]
O futuro presente de Noêda: um lugar atemporal onde o passado, o presente e o futuro florescem numa só voz. A família Saldanha e a família Moutinho têm, no seu baú, histórias que misturam os três tempos, sobre a zona que batiza a Associação Recreativa “Os Malmequeres de Noêda”.
Não é do passado que se fazem notícias, mas no resgate de memória é este tempo verbal do indicativo que predomina. Noêda é a zona que dá nome à associação que caminhou para a Travessa de Miraflor e que, para trás, deixou um trilho de malmequeres que agora florescem com a Primavera. É na parte de trás de Campanhã que se inicia este trilho.