Porto Express, Bistrorante Vietnamita: raízes asiáticas na invicta
[Texto, video e fotografias: Carolina Alves e Clara Correia]
Na rua Joaquim António de Aguiar, mesmo ao lado do Jardim de São Lázaro, no coração do Porto, há um pequeno restaurante vietnamita que tem vindo a conquistar o paladar dos portugueses desde novembro de 2021, “c”. Mais do que um espaço de restauração, é uma história de autenticidade e de um encontro entre culturas, contada à mesa por uma cozinheira vietnamita,Loan Kim Nguyen, de 39 anos, e um proprietário alemão, Jochen Manuel Reliberg de 47 anos, que escolheram Portugal como casa.
O proprietário, relembra como tudo começou com uma procura simples por um local através de uma plataforma imobiliária. O negócio surgiu de um “trespasse” com o anterior proprietário, num momento que descreve como “o prego final no caixão” do restaurante anterior. Depois de algumas negociações, nasceu um novo conceito: um espaço familiar dedicado à verdadeira cozinha do sul do Vietname. “Desde o primeiro dia percebemos que não era possível gerir aquilo só os dois. A afluência foi muito acima das nossas expectativas”, confessa.
O “nós” inclui a esposa vietnamita, a verdadeira força criativa por trás da cozinha. As receitas vêm diretamente da mãe de Loan, natural do sul do Vietname, e a filosofia é clara: nada de adaptações ao gosto europeu. “Não queremos agradar ao paladar europeu. O que servimos é como se estivéssemos a comer no Vietname”, afirma.

Jochen Manuel Reliberg e
Loan Kim Nguyen
A distinção entre a cozinha do Norte e do Sul do país asiático é marcante. No Sul, o uso do açúcar é mais frequente, conferindo aos pratos um toque subtilmente mais doce. Um dos ex-líbris da casa é o phở, a famosa sopa tradicional vietnamita composta por caldo aromático, noodles de arroz, ervas frescas e carne ou tofu. É um prato de conforto nacional no Vietname e aqui é preparado com uma receita pessoal transmitida entre gerações. É consumido a qualquer hora do dia, especialmente ao pequeno-almoço, e está profundamente ligado à memória afetiva dos vietnamitas. “O phở da minha esposa é quase medicinal. Quando tenho dores de cabeça, como e, 15 minutos depois, desaparecem”, brinca o proprietário, referindo-se ao poder reconfortante e revigorante desta sopa rica em especiarias e ingredientes frescos.

phở e
Bún Thịt Nướng Chay
Num bairro em crescente transformação artística e multicultural, este restaurante de gastronomia vietnamita encontrou o seu público. O proprietário estima que 60% dos clientes sejam locais e os restantes 40% turistas ou residentes estrangeiros, especialmente americanos e israelitas. Mas há algo em comum entre todos, sempre voltam.
“O segredo é a qualidade constante. Não importa se estás doente ou maldisposto. Quem vem cá tem de receber o melhor, sempre.” Com quatro funcionários e uma clientela fiel, o restaurante orgulha-se dos ingredientes frescos, a carne que vem de um talho local, os legumes que são escolhidos a dedo, e nada é pré-preparado. “Os nossos rolinhos primavera são feitos no momento. Nunca estão há três semanas no congelador”, informa.
Além da carne, há uma oferta extensa de pratos vegetarianos e veganos, como O Gỏi Cuốn Chay, rolinhos de papel de arroz recheados legumes, servidos com molho de feijão preto e o Bún Thịt Nướng Chay, noodles vietnamitas acompanhados de legumes, cogumelos e molho de soja preto. Estas opções refletem a forte influência da tradição budista vietnamita, onde muitos monges seguem uma dieta sem carne. Uma escolha que, além de cultural, responde também à crescente procura por alimentação saudável por parte das gerações mais jovens.
Apesar da paixão pela gastronomia portuguesa, especialmente pelo bacalhau com natas, o dono não se imagina na cozinha. “Não sei cozinhar. E a minha mulher também não me deixa! Ela é a alma do restaurante”, exclamou sorridente.
No final da conversa, fica claro que este pequeno restaurante não é apenas um negócio, é um espaço de memória viva, onde a tradição, o afeto e identidade se cruzam a cada prato servido. É a materialização de um legado familiar, transmitido de mãe para filha, agora partilhado com o Porto através de sabores fieis às raízes vietnamitas. Mais do que uma simples refeição, cada visita é uma viagem: à infância de Loan, ao cuidado dos mercados locais, à paciência de quem cozinha sem pressa. E é essa autenticidade honesta, artesanal, feita com alma, que faz com que quem entra pela primeira vez sinta vontade de regressar. Porque aqui, à mesa, serve-se muito mais do que comida. Serve-se pertença.