A arte que veio do Brasil ao Porto

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A arte que veio do Brasil ao Porto

Da Ilha do Governador para o Porto, Paulo Chiapetta, carrega nas mãos mais do que pincéis, carrega sonhos. Aos 22 anos, o jovem artista atravessa os desafios de ser imigrante em Portugal enquanto transforma a sua arte em resistência.


[Sofia Pereira, texto e fotografias]

Paulo Chiapetta, também conhecido como Chia, tem 22 anos e é natural da Ilha do Governador, no Rio de Janeiro. Chegou a Portugal com um objetivo claro, aprofundar os seus conhecimentos nas artes plásticas e encontrar um caminho mais sólido para a sua carreira artística.

“Saí do Brasil para estudar e crescer como artista”, começa por contar Chia, enquanto o aroma do café fresco se mistura com o som das conversas ao redor. “No Brasil, estudei design na Estácio, mas sabia que aquilo não era o que eu queria fazer”, refere o jovem artista.

Paulo Chiapetta decidiu deixar a faculdade de Design e dar um passo mais audacioso ao mudar-se para Portugal, em maio de 2024, ingressando em Setembro em Artes Plásticas na Faculdade das Belas Artes da Universidade do Porto.

Aos 22 anos, já carrega consigo uma bagagem de desafios e superações. Ao refletir sobre a sua jornada, revela as principais diferenças entre os dois países.

Entre os desafios de ser estrangeiro e a luta pela sobrevivência

Numa tarde iluminada pelo sol que entra pelas janelas do pequeno café Tia Alina, no Porto, onde Paulo Chiapetta trabalha, a sua história parece estar em constante movimento.

Café Tia Alina – Foto Sofia Pereira

Para Paulo, chegar a Portugal e seguir os seus sonhos na arte não foi um caminho sem obstáculos. “Faço das tripas coração para conciliar estudos e trabalho, ao mesmo tempo que mantenho as propinas da faculdade em dia”, revela, referindo-se ao esforço diário de equilibrar o trabalho no café e os estudos em Artes Plásticas. 

A vida de estudante internacional traz uma carga extra,pagar o dobro das propinas e, muitas vezes, encarar a realidade de que a comida é escassa. “Às vezes, falta comida em casa”, confessa, olhando para baixo, com um olhar triste e carregado de esforço.

Para ele, o maior obstáculo tem sido o preconceito e o racismo. “Saí de trabalhos por conta de ameaças à minha vida, só por ser brasileiro. Já tentaram agredir-me, com facas, armas, ofensas, piadas, todo o tipo de agressão”, conta, com a dor ainda presente na sua voz.

“É difícil, mas sigo em frente. O meu sonho é o que eu tenho e é só por ele que eu continuo a lutar”, confessa.

A realidade de quem vive na incerteza

O jovem de 22 anos atravessa um processo de adaptação complexo, com o visto ainda em andamento. Com uma visita agendada à AIMA este mês para concluir as formalidades, o artista enfrenta, entretanto, desafios que vão além da burocracia. 

Atualmente vive numa casa pequena, em Ramalde, partilhada com mais cinco pessoas, sendo que no seu quarto dividem-se três. “Não durmo bem há dez meses por conta dos meus colegas de casa”, confessa com tristeza.

A impossibilidade de mudar de casa está diretamente ligada à sua realidade financeira, o custo da faculdade e o aluguer de um espaço adequado estão além das suas possibilidades.

A solidão é, muitas vezes, uma presença constante na sua vida. “Sinto-me extremamente solitário e perdido, mas, ao mesmo tempo, não me arrependo de nada”, sublinha, com uma expressão marcada pela determinação.

Apesar das dificuldades, Paulo Chiapetta reconhece que o Porto lhe ofereceu oportunidades que jamais imaginaria. “Eu vivia mil vezes melhor no Brasil, mas não tinha metade das oportunidades que o Porto me proporcionou. Aqui, pude estudar o curso que sempre sonhei, viver experiências que jamais imaginei e conhecer lugares de que só ouvira falar”, disse.

Entre a arte e a superação

Para Paulo, a arte é a sua única fuga e, ao mesmo tempo, a sua maior motivação. O desejo de se tornar um grande artista é o que o mantém de pé, mesmo nos momentos mais difíceis. “A minha arte é o que me faz continuar, mesmo quando tudo parece perdido”, comenta com um olhar sereno.

Embora o seu caminho tenha sido árduo, Chia continua a alimentar a esperança de que, em algum momento, as dificuldades serão recompensadas. “Eu posso ter saído do meu país, mas não vou deixar a arte me deixar para trás. Vou continuar a estudar, a criar e, quem sabe, um dia, ensinar o que estou a aprender agora.”

Este ano tem sido uma verdadeira jornada de autodescoberta para Paulo. “A minha faculdade é dividida em três áreas no primeiro ano. Primeiro, estudei pintura, depois multimédia, e agora estou a estudar escultura”, relata o jovem artista.

Embora ainda esteja indeciso, a pintura parece ser a opção  predominante para o seu futuro profissional.

No entanto, a concorrência é intensa. “Estudar e trabalhar ao mesmo tempo torna difícil obter boas notas para competir no ranking”, refere.

Apesar de todas as dificuldades, Paulo recebeu uma grande honra ao ser convidado pelo Pinguim Café para recriar o seu projeto artístico designado por Hachuras, que já faz sucesso no Rio de Janeiro.