Má gestão quase levou ao encerramento do STOP

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Má gestão quase levou ao encerramento do STOP

Em julho de 2023, 105 dos 126 espaços do Centro Comercial STOP foram encerrados pelas forças policiais, alegadamente por falta de segurança e, também, falta de licenciamento. O que poderá ter levado a esta escala de acontecimentos?

[Investigação conduzida por Adriana Ferreira, Inês Costa, Mateus Carvalho e Paulo Pereira]

Décadas de má gestão

O edifício histórico portuense abriu portas como um tradicional centro comercial em 1982 e, desde aí, poucas vezes viu mudanças na administração, “durante vinte e tal anos a mesma direção tomava posse passando de geração em geração”, menciona o gerente do café do STOP, Hugo Gonçalves. 

O STOP funciona como um condomínio comum, cada um dos espaços é de carácter privado e o seu proprietário estipula o preço do aluguer, “o valor das lojas está registado nas finanças, 50 mil, 100 mil euros 200, 300… por aí fora”, destaca a fonte. No final do mês existe a respetiva taxa condominial à administração, de forma a cobrir os custos de manutenção, neste caso poucos existiam.

De acordo com uma fonte próxima da atual administração, os antigos administradores eram “bastante  tolerantes” em relação aos pagamentos dos condónimos, impedindo a colaboração entre a administração, proprietários e usuários, o que levou a uma situação de rutura.

Existiam vários motivos para não terem sido regularizados os pagamentos, entre outros foram-nos indicados a falta de confiança entre os proprietários dos espaços e a administração, devido à falta de manutenção do edifício. Em casos mais extremos alguns proprietários não sabiam que os espaços estavam em seu nome.

O gerente do café aponta o dedo à antiga administração por “durante os anos em que estiveram em exercício, não dar a conhecer os processos eleitorais, de acordo com os estatutos”.

Fonte próxima deste processo longo revelou-nos que “nunca houve mais ninguém na administração, sempre controlaram o shopping”. Na verdade, apurou a nossa equipa de reportagem, nunca existiu uma lista concorrente para gerir o STOP.

Luís Botelho, antigo baixista da banda Cape Torment

De acordo com o gerente do café, a administração não passava recibos a alguns proprietários e, aos que passavam, o pedaço de papel pouco valor tinha, “o que eles passavam não contava para nada, era um papel branco com umas linhas azuis assinado pela administração do STOP”. Confessam que não tinham a certeza se o dinheiro ia de facto para as finanças.

Além disso, estas eleições, pelo que a mesma fonte adiantou, eram pouco democráticas, “todos os anos vinham com as mesmas resmas com as assinaturas, e já com as suficientes para se auto-eleger (…) não havia hipótese de outras concorrem”, acrescentou.

A nova administração, que é constituída por indivíduos que já faziam parte da comunidade do Centro Comercial STOP, foi a única a candidatar-se às eleições do espaço. Segundo esta fonte, a antiga administração não viu a necessidade de voltar a candidatar-se, já que fingiu não ver o estado em que o centro comercial se apresentava, e deixou que o prédio fosse perdendo condições com o passar dos anos: “Acho que já não quiseram porque já estavam comprometidos com a degradação do edifício, anos após anos.”.

Orçamentos

Os orçamentos eram discutidos apenas porque estava prescrito na lei e apenas era alterado o ano orçamentado, o restante era “copy paste do ano anterior”, revelou- nos uma fonte próxima da administração.

Para além disso, garantiu que muito do dinheiro era alocado para fins “misteriosos”, alguns para prémios monetários, outros para diversos.

Foi-nos garantido pela atual administração que esses valores estão a ser alocados para fins concretos, exemplo disso são as atuais obras no edifício. Os responsáveis pela gestão do STOP sublinham também que não estão a desviar-se do valor pré-estabelecido pela anterior.

Para além disso, durante dez anos, a Câmara do Porto garante ter tentado entrar em contacto com a antiga administração para se inteirar dos problemas ocorridos no edifício e os planos para o futuro, porém, alegadamente, esta nunca respondeu.

Arrendar salas sem o conhecimento do proprietário?

Pelo que nos foi transmitido pela fonte próxima da administração que assume ter presenciado grande parte destes detalhes aqui descritos, alguns proprietários viviam longe do Porto ou mesmo fora do país e a única forma de atualização face às suas salas era através da comunicação com a administração. No entanto, “ocultavam que o espaço estava a ser alugado e, alegadamente, recebiam a quantia mensal”.

Alguns não sabiam que a loja estava alugada, e quem é que recebia o dinheiro da renda? Não o dono, que estava ausente, mas o condomínio.

Fonte próxima da admininstração

Muito barulho aumentou número de queixas

O Centro Comercial STOP já recebeu mais de 600 queixas dos vizinhos, algumas com o envolvimento de participação policial, conforme foi relatado por Hugo Gonçalves, gerente do café. Cansada das reclamações, a administração contratou uma empresa para realizar a insonorização contra o excesso de ruído. Com o consentimento de um vizinho, a empresa instalou aparelhos mediadores de ruído na casa deste.

O parecer técnico revelou que, mesmo com janelas duplas, o nível de ruído ultrapassava o permitido por lei. Com base nessa análise, a administração decidiu colocar as bandas que se encontravam instaladas nas salas encostadas à fachada do edifício nos estúdios das traseiras de forma a não perturbar a vizinhança. Mesmo assim, o mesmo vizinho continuou a fazer queixas devido ao barulho.

Uma nova fase com novas ideias

Na primeira assembleia desta nova administração, uma das diferenças notadas no funcionamento foi o aparecimento de “dezenas e dezenas” de proprietários com o intuito de resolver o passado e definir o futuro do centro comercial, contrastando com os “seis ou oito” proprietários que apareciam nas reuniões da antiga administração.

Quando os novos administradores tomaram posse, o problema imediato que tiveram de enfrentar foi uma dívida significativa. Neste momento estão a tentar ganhar novamente a confiança dos proprietários, “já recuperámos vários por negociação, por conversação, dizendo, nós somos diferentes. Porque razão alguns não pagavam? Porquê? Era assim, vocês não tratam de nada, nem querem saber da minha loja”, menciona uma fonte próxima da atual administração.

Comparativamente ao que a anterior administração fez, de acordo com a mesma fonte, atualmente há a tentativa de reaver, pelo menos, os últimos 5 anos de pagamentos em atraso, tendo esse prazo prescrito por lei que, “ao contrário da anterior, colocam uma ação em tribunal”. Naturalmente, há um maior rigor para regularizar os pagamentos em falta.

De forma a contrapor este argumento, garante a atual administração, foram realizadas reuniões ordinárias, vão ser promovidas discussões anuais sobre os orçamentos, bem como uma plataforma online que nunca existiu, “passo o recibo do condomínio que pagaste este mês, recebes um código de acesso a esse programa informático de condomínio, vais ver se deves, se não deves, se estás em dia, quanto é que já pagaste, desde que estás na loja, etc. Coisa que não existia”, exemplificou um dos membros da administração.

De forma a manter o STOP vivo, houve a necessidade de acatar as ordens impostas pela autarquia. Neste momento já foram colocadas câmaras de segurança, extintores e está a ser planeada uma cobertura para o teto, tudo isto com base em empréstimos. Além disso, seguem regras rigorosas no que toca ao horário, abrem às 11:00 e fecham às 23:00, devido ao horário dos bombeiros sapadores, que trabalham apenas durante aquele período.

Fotografia de Paulo Pereira

Antes de ser um centro cultural

Antes do STOP ser aquilo que é hoje, este edifício já tinha uma longa história. Inaugurado no ano de 1950, o atual centro comercial era uma oficina multimarcas, onde trabalhava especificamente para as marcas inglesas Austin, Lotus e Bentley. Na sua fachada, havia stands e viaturas novas expostas, enquanto nas traseiras encontravam-se as oficinas de cada marca. Ainda hoje, podemos ver vestígios do seu propósito original, como as rampas por onde os carros passavam e a própria estrutura do edifício.

Em 1982 o edifício sofreu remodelações e foi se transformando num centro comercial, com uma arquitetura e estilo semelhantes aos que começavam a surgir nos anos 80. Isto aconteceu porque, com o tempo, houve uma expansão das próprias oficinas das marcas que potencializou a necessidade de adaptar o edifício para outras funções.

Perante todas estas acusações de má gestão, a antiga administração não se mostrou disponível para prestar qualquer tipo de esclarecimento apesar das várias tentativas de contacto ao longo dos últimos meses.