Novos Caminhos da Sustentabilidade na Moda: Da venda em segunda-mão à “slow fashion”
- Ana Luísa Capelo
- 22/01/2021
- Arte e Culturas Moda
Os apelos à consciência ambiental não são de agora, mas, mais que nunca, são ouvidos e valorizados. A indústria fast fashion é a segunda mais prejudicial para o planeta, há uma urgência de alternativas sustentáveis. Sofia Sá Couto, Alexandra Sousa, Maria Marques e Mar Mera Romón através do seu trabalho promovem esta mudança de paradigma.
O cenário em altura de saldos é semelhante um pouco por todo o Mundo: a desorganização total das prateleiras e dos cabides, a correria caótica para ver quem consegue as melhores ofertas e a fugacidade com que os artigos são vendidos. Numa questão de minutos, centenas de peças esgotam. Posteriormente, à semelhança do que acontece nas lojas, nos caixotes de lixo as roupas amontoam-se, descartadas com a mesma rapidez e leviandade com que são compradas. As injustiças ambientais perduram durante todo o processo, mesmo após a peça ser vendida.
Inclusive, “já há roupa suficiente para vivermos dezenas e dezenas e dezenas de anos, não precisamos da produção de mais linhas” conta Sofia Sá Couto, uma estudante de Comunicação Empresarial no Instituto Superior de Contabilidade e Administração do Porto (ISCAP) e, simultaneamente, dona da loja Born Again, que se dedica ao comércio on-line de roupa em segunda mão. O surgimento da indústria de fast fashion, moda rápida, foi um dos fatores sentenciadores do consumismo desmedido de vestuário.
Este modelo disponibiliza peças que, no seu design, se assemelham a alta costura, mas que, na realidade, são produzidas com matérias primas de baixa qualidade por trabalhadores mal remunerados. Isto faz com que, naturalmente, as peças sejam mais baratas – daí a ideia de que são facilmente descartáveis e substituíveis. “A frase mais defendida na sustentabilidade é: não compres em quantidade, compra em qualidade”.
Num período em que, mais do que nunca, se discutem questões como a ecologia e a sustentabilidade, os consumidores também começam a procurar alternativas de compra que vão mais de encontro a estes ideais ambientalistas tão apregoados hoje em dia. Indiscutivelmente, a indústria de fast fashion é uma das mais prejudiciais para o ambiente, tendo sido considerada pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento como sendo a segunda mais poluente do Mundo, logo a seguir às empresas de petróleo. Por muito que estes gigantes do têxtil se mobilizem a tentar esconder os factos, a verdade é que “graças às redes sociais nós [promotores da sustentabilidade] vamos ganhando voz e vamos conseguindo elucidar pessoas que, por vezes, nem estão a pedir para ser elucidadas, mas, se nós partilhamos, é visto pelos nossos seguidores, nem que sejam apenas 100 pessoas: estamos a ser influenciadores.”
Ciclo da Moda “Fast Fashion” Por ano, são compradas cerca de 80 biliões de peças de roupa em todo o Mundo, o que se traduz num lucro de $1.2 triliões de dólares para as várias indústrias de produção de fast fashion (Fonte: Environmental Health). Da roupa vendida na União Europeia (UE), apenas 1% é, depois de usada, reciclada de forma a dar origem a novas peças, 80% acaba categorizada como lixo sólido em aterros sanitários localizados em países em desenvolvimento. (Fonte: BUND – Friends of the Earth Germany). O resto da roupa, que não tem estes fins, acaba por ir parar ao comércio em segunda mão. |
A venda de roupa usada é um mercado que, ultimamente, tem aumentado exponencialmente: as previsões apontam que o seu valor vá triplicar desde 2019 até 2029, chegando a valer $80 biliões de dólares e a ter um aumento de fluxo comercial na ordem dos 185% (Fonte: The Conversation). Foi precisamente em novembro de 2019 que Sofia começou a vender roupa em segunda mão. No início, tratava-se apenas de um projeto em conjunto com a sua irmã, no qual pretendiam dar uma nova vida a algumas peças que já não usavam, mas, em apenas um mês, conseguiram vender toda a roupa disponível. Rapidamente, o negócio tomou proporções: “quando me apercebi, ganhava cerca de 1000 seguidores por mês”, recorda.
Ainda que se adivinhe um desenvolvimento abrupto deste ramo da sustentabilidade, a verdade é que, atualmente, ainda há alguma desconfiança face este setor. Na verdade, “as pessoas já estão robotizadas para acreditar que, se não damos muito dinheiro por algo, isso não é bom”: os preços baixos são, simultaneamente, uma das maiores vantagens e desvantagens dos negócios em segunda mão. A dona da “Born Again” esclarece que isso tem de ser desmistificado. “É produzida muita roupa, há muita quantidade em todo o Mundo e, por isso, nós [lojas de roupa em segunda mão] conseguimos ter acesso a uma grande quantidade de artigos a um preço muito económico. É qualidade e valor reduzido, tudo num só artigo”.
Este ano, por exemplo, dei toda a minha roupa de inverno, tudo! Disse: vou reconstruir do 0 o meu armário, todo em segunda mão. Por 150€, consegui. Comprei malhas, calças, macacões, vestidos, botas…. Não há melhor que isto, o melhor incentivo que podemos dar para as pessoas comprarem em segunda mão é sermos o exemplo vivo.
Porém, comprar em segunda mão vai para além disso. É, sobretudo, uma escolha consciente dentro dos vários ramos da sustentabilidade. Enquanto que grandes indústrias têxteis de fast fashion chegam a produzir 20 segmentos de linhas de roupa nova por semana, o comércio em segunda mão vem quebrar essa cadeia de consumismo e traz à discussão o conceito de economia circular – um sistema que assenta na reorganização dos sistemas de produção com base na redução, reutilização, recuperação e reciclagem de matérias. “Devíamo-nos sentir gratos por termos a possibilidade de adquirir roupa a um valor incrível, passam por mim peças feitas em todo o mundo! É impossível não ter um cunho de carinho. Há uma estima muito maior, aliada ao valor reduzido, à qualidade, e, sobretudo, saber que estamos a contribuir para uma economia circular… Há que motivar as pessoas à nossa volta e a melhor forma de o fazer é dando o exemplo” afirma Sofia.
Cada vez mais estabelecem-se lojas de roupa em segunda mão um pouco por todo o país. Apesar de este ainda ser um conceito com uma maior adesão nos centros urbanos, está rapidamente a difundir-se. Não obstante, a maioria dos negócios ainda se mantêm no on-line, sobretudo em redes sociais como o Instagram ou o Facebook, que são também elementos essenciais no que toca à consciencialização. Atualmente “está a começar na geração mais nova que tenta elucidar os mais velhos; a cada mês que passa, estas grandes empresas estão a perder a voz – as pessoas estão mais atentas” evidencia a jovem empreendedora.
Se existisse um grupo de escravos em cada loja de fast fashion, a trabalhar dentro de uma redoma de vidro para as pessoas que passam lá verem, talvez a moda rápida já não tivesse tantos clientes.
Sofia Sá Couto lamenta ainda, que, por vezes, o seu trabalho não seja devidamente valorizado, tal como acontece com outras lojistas que trabalham somente no digital. “Sinto que não há o reconhecimento devido das páginas de venda em segunda mão, principalmente quando é uma página on-line, que são as que existem em mais quantidade. Acho que, quando a loja tem um espaço físico, tal não acontece porque as pessoas têm de encarar diretamente outro ser humano, automaticamente passa a existir uma linha de respeito”, confessa a estudante que, ainda assim, garante “grande parte de mim está colocada neste projeto”.
Sendo apenas uma das várias opções que constituem as alternativas emergentes à compra de fast fashion, o comércio de roupa em segunda mão acaba por estar inerentemente ligado a mais áreas da sustentabilidade, como é o caso do upcycling, uma prática que consiste em dar uma nova vida a artigos que, de outra forma, seriam dispensados.
No caso da roupa, pode surgir, por exemplo, sob a forma de reparação e personalização de peças ou aproveitamento de tecidos. Enquanto responsável por este negócio, Sofia confessa que essa é uma tarefa com que se depara frequentemente “numa indústria de fast fashion há 500.000 empregados, mais 500.000 empregados desses empregados, centenas de revisores desses mesmos empregados e assim sucessivamente, é um sistema enorme em que ninguém conhece ninguém. Aqui eu sou sozinha: faço a triagem, a curadoria de todas as peças, lavo, coso botões e buracos, tiro manchas, …”.
“O meu objetivo é manter tudo slow“
Também na baixa portuense há um espaço dedicado, não só ao upcycling, mas também à comercialização de moda slow fashion. É no 108 da Rua dos Caldeireiros que se localiza a Araucana – Slow Fashion & Upcycling, uma loja inaugurada em março de 2020. Neste estabelecimento o processo de personalização das roupas é bastante simples, Alexandra Silva, a proprietária, explica que colabora com uma designer e uma modista, “o cliente apenas traz uma peça de roupa que quer transformar, normalmente aconselho a que seja um artigo com alguma qualidade, nós fazemos um desenho, elaboramos o orçamento e, assim que a pessoa aprova, avançamos com a operação”.
Este é um serviço que faz parte da loja desde o primeiro dia e, segundo Alexandra, faz todo o sentido que assim seja, “o upcycling é sustentável, dá uma vida mais longa aquele artigo que já temos, a sustentabilidade é mesmo isso, alongar o ciclo dos produtos”.
A Araucana é o primeiro passo de Alexandra no mundo da moda. Antes de abraçar este projeto trabalhava enquanto diretora industrial, um trabalho que descreve como “interessante e desafiante”, mas, simultaneamente “extraordinariamente desgastante: dirigir uma fábrica que trabalha sete dias por semana, 24 horas por dia, não era fácil”. Curiosamente, a ideia de abrir a loja surgiu no outro lado do globo, mais propriamente em Bali, durante uma viagem pelo continente asiático. Foi ao visitar o país que, numa zona comercial, encontrou uma loja que lhe agradou bastante, inclusive, afirma que se lembra de na altura dizer “eu gostava mesmo era que a minha vida agora fosse assim, ter uma loja bonita e uma vida bem mais calma”.
O misto entre o stress do quotidiano e a ambição de adotar um novo estilo de vida motivou a empresária que, quando chegou a Portugal, começou a mobilizar meios para, meses mais tarde, abrir um espaço comercial de slow fashion. Foi assim que surgiu esta vertente da moda lenta na sua vida, em oposição à fast fashion, a slow fashion não prioriza o lucro, valoriza, sobretudo, métodos de produção dignos e a produção em baixa escala. Para além disso, há ainda uma forte ligação entre a moda lenta e o comércio justo, um modelo económico que tem como prioridade a sustentabilidade da produção e a transparência com o cliente.
A proprietária evidencia que “não é possível dizer que acreditamos no comércio justo e depois produzirmos com uighurs na China em campos de trabalho forçado”, como muitas indústrias de fast fashion. Este é um dos maiores problemas sociais gerados pela manufatura de moda rápida, as grandes empresas insistem em produzir nos países em desenvolvimento de forma a terem acesso a mão de obra barata, muitas vezes não salariada e sem regulamentação por nenhuma entidade. Um dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, estabelecidos pela Assembleia Geral das Nações Unidas, é precisamente nesse sentido, visa estabelecer padrões de produção sustentáveis e, acima de tudo, humanos.
Motivada por todos os conceitos e práticas recém descobertos, a antiga diretora industrial decidiu contactar a marca que tinha conhecido em Bali, a Thaikila. “Perguntei-lhes se queriam vir para o Porto, expliquei que ia começar um projeto novo, eles disseram que sim e, aí, decidi avançar”.
Tentou negociar também com algumas marcas portuguesas, mas não sentiu tanta recetividade e, por isso mesmo, continuou a contactar marcas internacionais que, cordialmente, aceitaram trazer os seus artigos para o Porto. Neste momento, na Araucana, para além da produção própria, encontram-se marcas como a Thaikila, Carolina Ronderos, Sensify, Ecoalf, TDL, designers portugueses como a Bona Fide e também alguns artigos da Pé de Chumbo que, inclusive, “já fez algumas peças especiais para a loja só com restos de coleção”.
Passados dez meses desde a abertura da loja, Alexandra mantém-se fiel às ideologias associadas ao slow fashion e transpõe-nas não apenas na seleção de artigos que dispõe na loja, mas também na forma como a gere. Por exemplo, declara que não faz saldos, independentemente da faturação desses meses, em que todas as montras de centros comerciais se completam com letreiros a anunciar descontos. A moda lenta não é isso, instigar ao consumismo aliciando o público com preços abaixo da média, é “vender marcas intemporais de design, produzidas com matéria prima de qualidade; é comprarmos uma peça e sabermos que vai durar muitos anos”.
Este é o início da Araucana, um espaço minimalista e acolhedor que preza pela inovação e autenticidade em cada peça que expõe. Desde a utopia idealizada em Bali, até à materialização num prédio centenário restaurado na tradicional rua da cidade invicta. Alexandra nunca baixou os braços e, independentemente das adversidades que encontrou, adverte que quando inicia um projeto “a energia é toda positiva”.
Evidentemente, a responsável pretende que o negócio corra da mesma forma que a sua vida, isto é, deseja “manter tudo slow”, sendo que a sua perspetiva mais vincada para o futuro seria abrir uma outra Araucana, só que na capital. O slow fashion ainda é um conceito relativamente novo que pouco a pouco vai ganhando destaque e, apesar de esta não ser a única loja no Porto, é uma das pioneiras.
Fotografia: Ana Luísa Capelo. Fotografia: Ana Luísa Capelo. Mala TLD feita com anilhas de latas e cascas de laranja desidratadas. | Fotografia: Ana Luísa Capelo.
O Movimento de Slow Fashion Português
A verdade é que os “jovens já estão extraordinariamente canalizados para comprar slow fashion, o problema é que ainda não têm dinheiro e, de facto, cá em Portugal, nós sabemos que o nosso rendimento médio é muito baixo”, enquanto que “as pessoas mais velhas, ainda não têm tanto essa mentalidade de que, para comprarem uma peça, vão ter de despender mais dinheiro, porque é um artigo em que toda a cadeia de valor dessa peça teve uma remuneração justa de trabalho” informa a proprietária da Araucana.
Quando colocada a questão “porquê os jovens?” a resposta torna-se evidente e Sofia, criadora da loja “Born Again”, já a tinha evidenciado também. Grande parte da consciência de que a geração mais nova é dotada face a problemas ambientais surge graças à forte presença de apelos à sustentabilidade nas redes sociais, estas são, comprovadamente, fóruns eficazes no que toca ao à difusão de informação e ideologias.
Neste sentido, a página no instagram do movimento “Slow Fashion Portugal” foi criada em novembro de 2020 e reúne, até à data, 171 seguidores. Este foi um projeto assumido por Maria Marques, uma jovem estudante de biologia com 17 anos que, ao mesmo tempo que concluí a sua licenciatura, coordena voluntariamente esta iniciativa. De forma desinibida assume que “em Portugal este assunto precisava de ser um pouco mais explorado” e foi este sentimento de necessidade de mudança que a levou a fundar esta página.
O projeto está inerentemente associado ao “Slow Fashion Movement” que, por sua vez, é um dos programas da associação “The Green Wave” para combater a crise climática. Esta é uma organização sem fins lucrativos que consiste na união entre pessoas de todo o mundo com um objetivo comum: diminuir os impactos da poluição no planeta. Como tal, existem três projetos em curso que pretendem diminuir o impacto das indústrias da moda, da alimentação e do turismo.
“Slow Fashion Movement” ↻ Incentiva a minimizar o consumo de roupa e a optar por alternativas sustentáveis. “Flip The Food System” ↻ Promove uma alimentação sustentável, não necessariamente uma dieta vegan ou vegetariana, mas que permita que não se esgote todos os recursos do planeta. “Slow Travel Journey” ↻ Ensina as pessoas como viajar de forma menos poluente. |
Quando a portuguesa se juntou à equipa, este ainda não era o “Slow Fashion Movement”, mas sim a “Slow Fashion Season”, que consistia em “durante 3 meses, de 21 de junho a 21 de setembro, todos que quisessem participar comprometiam-se a não comprar quaisquer peças de roupa” explica. Ao longo dos anos, a adesão a essas temporadas sustentáveis foi tanta que surgiu a ideia de tornar esta iniciativa permanente, “quiseram transformá-lo num movimento que durasse o ano todo, para sempre”. Foi durante este processo de transição que surgiu a ideia de criar equipas específicas para cada país ou região.
As equipas locais, como são apelidadas, surgiram para que houvesse a “possibilidade deste movimento não se expandir apenas globalmente, mas também para ter a capacidade de chegar às pessoas, é muito fácil pedir a alguém da Europa Central para não consumir tanto e, quando o fizer, comprar de marcas que sejam sustentáveis”, mas isso não acontece em todos os pontos do globo e daí surgir a necessidade de adaptar a dimensão socio económica do discurso a todos os públicos que estavam a alcançar.
Durante os dois meses que se seguiram à criação do perfil dedicado ao movimento em Portugal, Maria confessa que, estatisticamente, “a página em si ainda não teve muita visão, algo normal quando se começa do 0”, mas que “as pessoas a quem falei da página interessaram-se pela ideia e quiseram saber um pouco mais sobre o conceito”. No futuro há a ambição de aumentar a visibilidade da página e, através desse alcance maior conseguir “educar uma comunidade de pessoas que vá aumentando ao longo dos anos, gostaria também de fazer campanhas locais que poderiam ser, desde coisas pessoais, como por exemplo, escolhermos uma peça do nosso armário e personalizá-la, ou campanhas com um cariz político, organizar ações para que, determinadas marcas, por exemplo, parem de tirar vantagem de trabalhadores em países em desenvolvimento”.
“A Natureza é sempre uma das minhas fontes de inspiração”
Um dos maiores impactos ambientais do fast fashion, surpreendentemente, manifesta-se antes do início do processo de montagem das peças.
Das etapas mais poluentes deste modo de produção, destaca-se a confeção dos tecidos: cerca de 60% das roupas de fast fashion são feitas a partir de poliéster e algodão. O poliéster é um tecido sintético derivado do petróleo, enquanto que os algodoeiros requerem largas quantidades de água e pesticidas para que possam crescer. Como se tal não bastasse, também as emissões de carbono resultantes do processamento dos tecidos é alertante, atualmente, só esta indústria, é responsável por 5% das emissões de carbono a nível mundial, gerando 1,2 trilião de toneladas de CO2 por ano (Fonte: Focus Online).
Por conseguinte, também a coloração dos tecidos se revela um problema, já que, frequentemente, a água utilizada para tingir, com todos os químicos necessários ao processo, é despejada em sistemas de água locais, libertando metais pesados e outras toxinas que podem ter um impacto adverso na saúde dos animais e dos seres humanos (Fonte: Environmental Health).
Mar Mera Romón é uma designer madrilense que se interessa ativamente pela questão da sustentabilidade. Já faz esboços há 4 anos, desde que começou a sua licenciatura em Desenho na Escuela Universitaria de Diseño, Innovación y Tecnología (ESNE), em Madrid, e, desde aí que trabalha sob o pensamento de que “a moda é uma forma de arte e precisa de acompanhar a evolução dos tempos, pelo que, a moda rápida já não faz sentido”.
Graças à influência do ativismo e ao elevado número de vozes ambientalistas que, cada vez mais, se fazem ouvir, a variedade no mercado de tecidos de origem sustentável aumentou gradualmente. Porém, há a ressalva que, qualquer tipo de produto que assente sob a égide do comércio justo tem um valor mais elevado porque, na base de produção, estão ideais sustentáveis e humanos. O custo elevado dos materiais acaba por ser um problema para novos designers, como é o caso de Mar, que, muitas das vezes, não tem possibilidades para fazer um investimento tão elevado. A madrilense contorna essas dificuldades e, na elaboração das suas peças, apenas recorre “a tecidos que eu própria crio, em casa, com os materiais que tenho, ou reciclando outros tecidos que já utilizei em coleções passadas, dando-lhes uma segunda visão e outra vida”.
A Natureza é sempre uma das minhas fontes de inspiração. Não apenas nos materiais que utilizo, mas também nas texturas que pretendo alcançar em cada um dos tecidos que elaboro à mão.
Criou uma marca, marmeraromon, e, do seu portefólio, fazem parte quatro coleções: “Heaven”, “Héroes”, “Muy Yo” e “Albufera”. Todas elas têm uma base sustentável e foram produzidas de acordo com esse ideal. Em “Heaven” foram utilizados, maioritariamente, tecidos de fibras naturais e vegetais; “Muy Yo” foi confecionada graças à reutilização de muitos tecidos que a designer tinha em casa e “Albufera” é uma coleção realizada com 100% de lã de merino.
Destaca “Héroes” que foi criada em maio de 2020, durante o primeiro confinamento, e surge como uma homenagem a todos os os profissionais de saúde que, heroicamente, nos hospitais, combatiam a COVID-19 na linha da frente. A designer menciona esta coleção porque conseguiu elaborá-la, na sua totalidade, apenas recorrendo a um tecido feito a partir de ligaduras médicas – através da disposição aleatória deste material, conseguiu criar uma mistura de cores e texturas únicas. Para ela, “as ligaduras são um símbolo de todos os heróis nesta luta, de toda a dor e cicatrizes que lutam para curar”.
A designer acredita que “pouco a pouco a sociedade vai-se consciencializando”, mas confessa que o caminho a percorrer neste sentido ainda é bastante longo. A indústria de moda rápida molda-se, sobretudo, pela efemeridade atribuída às peças de roupa e, também, por ser um impulso colossal a uma economia capitalista de consumo, estes são fatores que contribuem para a sua popularidade. “É complicado fazer concorrência a marcas tão poderosas”, confessa, “mas, acredito que, pouco a pouco, entre todos [novos designers], podemos caminhar ao encontro da promoção de uma moda sustentável e de qualidade”.
Evidencia a sua ambição em continuar a aprender e é nesse sentido que deseja continuar trabalhar, quer aprofundar os seus conhecimentos na área, prosseguir a estudar moda e aprender mais sobre o setor, tudo para que, num futuro próximo, consiga “ser uma marca totalmente (ou o máximo possível) sustentável e, assim, ter a possibilidade de dar a conhecer todos os valores que representam a marmeraromon numa maior escala”.