Bombeiros em Portugal: um trabalho para além da farda
- Mariana Venâncio
- 01/07/2022
- Portugal
Ser bombeiro é colocar a vida em risco para combater as chamas, salvar vidas e ajudar os outros. Uns fazem disto profissão, outros são voluntários. Independentemente das motivações, colocam a vida das pessoas em primeiro lugar e fazem jus ao seu lema “vida por vida.”
[Reportagem de Mariana Venâncio]
Foi há poucas horas que Fernando Campos entrou ao serviço. Vestido com a farda número três, verifica o material de mergulho, em que é especialista. O dia começou bem cedo. Às 8h00 tem de estar equipado. É a hora da formatura. Rapidamente os 22 elementos de bombeiros sapadores estão em linha para dar seguimento às suas tarefas. Mesmo ao fim de semana cumprem o ritual, aliás, é o mote inicial de cada turno. É uma estratégia definida pelos profissionais “no dia anterior, para quando entrarem ao serviço já saberem o que vão fazer.”
Por ser sábado é dia de limpeza de viaturas e de parques, mas continua a ser dia de servir a comunidade.
Campos nasceu e cresceu numa “linhagem de bombeiros voluntários.” É sapador há 23 anos e foi voluntário durante cinco. Sentia um grande gosto e adrenalina pelas “sirenes”, pelas “correrias” e pela “agitação de ser bombeiro.” Aos 22 anos concorreu para o concurso de bombeiro sapador, percebeu que “podia fazer o que gostava a ganhar dinheiro e juntar o útil ao agradável”, revela com um sorriso no rosto, evidenciando que foi a melhor opção. Candidatou-se para alguns locais e foi aceite nesta companhia – nos Bombeiros Sapadores e Proteção Civil de Vila Nova de Gaia, cidade onde reside.
Para entrar nas corporações profissionalizadas é “preciso” alcançar os três pilares essenciais de bombeiro sapador: o “conhecimento técnico e prático”, uma “boa capacidade física” e uma “capacidade psíquica adequada a esta profissão.” Não se pode ficar com elementos que “não sejam úteis para a casa”, por isso, trabalham situações “complexas” e colocam “estalos ao máximo para que se houver uma falha durante o curso, eliminar-se logo”, sublinha.
Não adianta estar preparado agora e daqui a uns anos não o estar, “não se vai conseguir colmatar a chamada e o socorro.” Há que estar bem preparado e Fernando considera que está. Como está em constante aprendizagem faz com que consiga responder, “de forma eficaz às situações mais bizarras que algum dia o cidadão possa imaginar”, garante.
O bombeiro caracteriza-se como “altruísta”, o tipo de pessoas que gosta “de fazer coisas radicais e energéticas” e ser sapador trouxe-lhe uma nova “realidade”, leva-o a “outros mundos.” É uma profissão “diferente”, pois há “muita interação com a sociedade, acabando por ter alguns benefícios, mas também se vê aquilo que há de mau”, diz. A comunidade “não é um filme cor de rosa”, pelo contrário. “Quando se entra na casa das pessoas, quando se recebe uma chamada, quando pedem auxílio” é, nesse momento, que se “percebe que não é um mundo que gostavas que fosse.”
Fernando é subchefe principal. No dia de hoje, ficou responsável por “distribuir as tarefas” aos restantes profissionais. Nuno Filipe está escalado à reserva. Nesta função faz-se “todo o tipo de serviços que ninguém quer fazer”, diz em tom de brincadeira, referindo que, por norma, os colegas de equipa não gostam. Por ter essa tarefa é responsável por levantar os “dois rádios e a lanterna, preenchendo a folha para o chefe verificar que os levantou.” De seguida, verifica o material das viaturas à qual ficou escalado. Quando o dever chama é a sua vez de ir para mais um serviço: uma “queda de estrutura.”
Mesmo com todo o trabalho diário, com toda a incerteza dos serviços que o esperam, custa-lhe viver sem ser bombeiro. Nutre um gosto por ajudar os outros e mesmo quando não está a fazê-lo gosta de toda a atividade que existe por detrás, que é desconhecida aos olhos da sociedade.
A sirene faz-se ouvir no quartel. É uma emergência médica. Cada homem e mulher sabe perfeitamente para que serviço vai. Fardam-se e dirigem-se para o veículo que já está pré-estabelecido. Desta vez, Fernando e Nuno não saíram, mas a qualquer momento podem entrar em campo.
A chamada entra e apura-se o máximo de informação possível. No quartel dos dois profissionais localiza-se a Central Municipal de Operações de Socorro (CMOS). Está “implementada no edifício dos bombeiros sapadores, mas não tem nada a ver connosco [sapadores]”, dizem. A sala gere todo o Município de Vila Nova de Gaia. O espaço é grande e nele encontra-se o chefe de equipa, um sapador e um bombeiro voluntário, cada um na sua respetiva secretária. A triagem é feita por estes elementos que acionam o alarme na companhia. Verificam a rua e direcionam também para os voluntários da zona mais próxima. Todo este processo tem de ser ágil. Não se pode demorar. Há vidas em jogo.
Um cenário diferente acontece nos Bombeiros Voluntários da Areosa – Rio Tinto, a cerca de dez quilómetros. Têm uma central de apoio às freguesias. Joana Nunes trabalha como centralista, mas também é voluntária. Sem estar nos planos tornou-se funcionária da casa. O objetivo era apenas fazer o trabalho de voluntariado, mas não foi isso que aconteceu. Estava desempregada e surgiu a oportunidade. Não hesitou e aceitou o cargo.
É vestida de vermelho que passa o dia. Muitas horas na central a atender telefonemas. Recebe as chamadas de socorro e está responsável por fazer o despacho dos meios e de “gerir todo o processo antes de chegar às equipas que vão intervir”, afirma a assalariada de 23 anos.
CURIOSIDADE: A chamada é atendida pela central 112 que identifica o cariz da chamada. Se for uma emergência médica encaminham para o INEM. Se for um incêndio pode seguir para a Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil, em que esse encaminhamento é feito para o corpo de bombeiros da área. |
Quando está na central, o telefone não para um segundo.
Parece um processo fácil para quem está de fora, mas para quem vive a realidade é muito diferente. Acaba por ser um trabalho “complicado”, admite sem receio. A “comunicação, muitas vezes, falha” entre o Comando Distrital de Operações de Socorro (CDOS) e o Centro de Orientação de Doentes Urgentes (CODU), acabando por “dificultar” as situações. Independentemente dos anos, acredita que as “falhas vão acontecer” porque “nem sempre depende dessas entidades, nem depende de mim, mas das pessoas que ligam” a pedir auxílio.
“As pessoas tornam-se bombeiras por um conjunto de razões de caráter pessoal: porque alguém na família o foi ou porque alguém têm uma dívida de gratidão [com os bombeiros]”
Miguel Aguiar Soares
Joana é bombeira há quatro anos. Com apenas três fazia parte das escolas de infantes e cadetes. Desde muito nova tinha o feeling que ia fazer desta a sua profissão e assim é.
Mariana Venâncio, 20 anos. Com muitos sonhos por realizar. Hoje, estou a concretizar mais um, estar no curso de Ciências da Comunicação. Ainda com sonhos pela frente, mas cada vez mais próxima de os realizar. Acreditar. Sempre! Gosto de sonhar. Faço parte da editoria de Saúde e é por lá que me quero aventurar!